sábado, 9 de maio de 2009

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Augusto Lula

O novo presidente da Samba (Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências), Augusto Luís, ou Augusto Lula, esteve há alguns dias no Cacho Dourado, restaurante lisboeta que já apareceu por esta coluna em texto de Manoel Onofre Jr. (confiram edição de 28 de fevereiro último).
Pois, Onofre Jr. contava que Luís Carlos Guimarães e Nei Leandro de Castro quando iam a Lisboa sempre arrumavam um jeito de tomar vinho num restaurante da Rua Eça de Queiroz, chamado Cacho Dourado. Isso, suponho, num tempo em que Nei ainda não tinha entabulado sua tese sobre o “vino della casa”, servido em jarra e tal. Outro papo, outra história.
O fato é que o nosso autêntico presidente Lula das ribeyras do Putigy e da lama do beco, que não é ruim da cabeça nem doente do pé, claro que, também ele, em destino madrilenho, arrumou seu jeito de escalar estrategicamente Lisboa e o Cacho Dourado da Rua Eça de Queiroz, antes de reencontrar Angeles Laporta, chilena-espanhola que já viveu por aqui e co-fotografou “As quatro margens do rio” com Don Giovanni Sérgio Hackradt. (Danielle Brito, inclusive, gravou voz e rosto de Laporta para sua série de vídeos “Memorex” – mas isso tudo são outros papos, outras histórias.)
Voltando para o Cacho e Augusto Lula diante do Cacho, foi lá que – ATENÇÃO, interrompemos a frase para alertar que o que vem a seguir é um “spoiler”, ou seja, antecipa algo que o texto só revelará no final, ou nem mesmo revelará. Então, prosseguimos: ... e foi lá que Lula sentiu a ausência de um outro Lula, o Lula Guimarães, da palavra salgada, do dia colorido, da fuga pontual, das traições bem-intencionadas. E reencarnou, ele mesmo, um pouco do homem de paletó cor de goiaba, “no morrer de cada dia” do poema “Canção urbana” – de quem Pedro Nava sentiu-se irmanado, à beira do “icto cerebral, a angina-pectoris, o edema agudo de pulmão e a asma cardíaca”. O poema vocês podem procurar nos livros de Luís Carlos Guimarães. O texto de Lula você só lê aqui:


ADIVINHE QUEM NÃO VEIO PARA O PEQUENO ALMOÇO
Depois de umas ginjas e cervejas nas Portas de Santo Antão e ainda em busca do pequeno almoço, pegamos um táxi e falamos: Cacho Dourado, Rua Eça de Queiroz. O motorista não lembra da cervejaria marisqueria, mas sabe onde é a rua, beleza. O xis da questão é que o referido fica depois do cotovelo da rua, praticamente onde ela acaba. Bato uma chapa logo ao bater a porta do carro. Vazio o restaurante, mais ou menos 12 horas. Danielle, de cara, olha logo as “”sapateiras (que nada mais são dos que os nossos guajás, sendo que imeeensos, no dizer de Danielle). Eu, meio enfadado, peço uma garrafa de vinho nacional. Pedimos marisco e começamos a entornar o vinho. Os brancos e azuis das mesas impecavelmente postas. Os pernis pendurados. Os garçons num entra e sai como se estivessem esperando um grande acontecimento. Quem sabe ele apareceria? pergunto. De repente, começa um abrir e fechar de porta deixando entrar um vento frio e o ambiente fica lotado. É um local freqüentado pelos portugueses, quase nenhum turista. Danielle pede as pernas da sapateira, e eu, fico olhando para a porta se abrindo e fechando, e ele não aparece. De repente, o que me chama a atenção é um homem sozinho numa mesa, nos seus cinqüenta anos bem morridos, a entornar seu chope silenciosamente. Quem sabe quando ele vai cruzar a ponte de safena? Fico vendo o tempo passar, esperando Godot. Amanhã vou estar com Angeles, quem sabe ele resolve aparecer. Por fim, ainda roubo um garfo para comer as patas dos guajás em Natal e sou flagrado no aeroporto com destino a Madrid. A moça da segurança diz que é para comer escargot e libera a arma mortal que a minha barba de muçulmano denuncia. Afinal, ela, ao revistar nossas malas, viu sabonetes do Brasil, castanhas de caju, doce de leite e rapadura, e ficou se deliciando com os mimos que nossa amiga iria receber. Mas o receio de chegar num aeroporto estrangeiro com um objeto cortante, me fez abandonar a bela manipuladora de pernas de sapateira antes de tomar o avião. Na Puerta Del Sol, pergunto a Angeles Laporta: adivinhe quem não veio para o pequeno almoço no Cacho Dourado? [Augusto Lula]



PROSA
“Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos.”
Isaías
O livro do profeta...
VERSO
“e nem sabe que a esperança
é não ter morrido hoje,
mas estar vivo amanhã.”
Luís Carlos Guimarães
“Dom Quixote do mar”

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