domingo, 29 de novembro de 2009

Os Manelões, os Migués


José Bezerra Gomes nasceu em Currais Novos, em 1911. Filho de tradicional família seridoense, formou-se em Direito em Belo Horizonte, foi vereador em sua cidade natal, escreveu alguns romances (“Os brutos”, “Por que não se casa, doutor”, “A porta e o vento”), e, foi poeta dos melhores.

No que se refere à sua vida, Anchieta Fernandes resumiu, em poucas palavras, definitivas: “viveu simples, produtiva e esquisitamente”.

Esquisitice que Luís Carlos Guimarães traduz como “temperamento arredio”, o que contribuiu, junto à obstinação no trato dos versos, em demorar a tornar o poeta conhecido do público.

Zé Bezerra Gomes buscava a concisão, o comedimento, a concreção. Cirúrgico, reescrevia seus poemas mutilando versos inteiros – “Com a melancolia da minha rua” vai da primeira versão, com 25 versos, à última, com apenas três.

Eis a integral:


Senhor, cotidianizaram a vida,

com escassez geral da alegria.

Senhor, mercantilizaram a vida,

com integral renuncia da poesia.


As ruas estão repletas, Senhor,

repletas de Manelões,

seres cotidianos,

criaturas pluralizadas,

com total embrutecimento,

absoluta carência de verve


Os cafés estão completos, Senhor,

completos de Manelões,

seres habituais,

criaturas comercializadas,

com grande dano para a discussão,

sensível falta de assunto.


As praças estão cheias, Senhor,

cheias de Manelões,

seres melancólicos,

criaturas cotidianizadas,

com notório prejuízo para o discurso,

rigorosa proibição do aparte.


Senhor, amanuealaram o mundo,

compadecei-vos, Senhor, do vate,

de João, Pedro e Paulo, Senhor.


E a versão mínima:

Senhor,

amanuealaram

o mundo


Hoje, os Manelões de Zé Bezerra poderiam ser substituídos pelo termo Miguelões, ou Migués.

E, apesar das tentativas de “rigorosa proibição do aparte”, sem prejuízo algum para o discurso – ao menos daqueles que acreditam na própria opinião e não têm nada a dever, nem a perder, muito menos a temer.

Engraçado, o Houaiss, tão moderno, não tem verbete para “Manelão”, nem “Miguelão”, “Migué”, “migué”, tampouco “miguelar” ou “amanuelar”.


sábado, 28 de novembro de 2009

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Lucílio Barbosa


Enquanto a transição das páginas impressas do defunto JH primeira edição não se realiza no www.marioivo.com.br, não vamos quebrar a tradição das manhãs de sábado, dia de música (José Bezerra Gomes: “Naquele/ sábado/ a música/ daquele/ sábado”) e embalos noturnos – enquanto a noite não chega, fiquem com a biologia literária de Lucílio Barbosa, diretor de criação da Art&C, biólogo por formação, poeta por deformação, velho companheiro dos bancos escolares, e, como ele mesmo diz, amigo.

observações sobre escatologia e funcionamento cerebral

Tem um princípio da física que diz: quem caga e anda pode acabar escorregando na própria bosta.

Não é natural cagar e andar, porque o ato de cagar implica em uma sessão de relaxamento e introspecção, e solidão, e recolhimento, e leitura que não combinam com o andar. Andar e ler, por exemplo, causa enjôo.

Andar é flanar, socializar, olhar, conhecer, descobrir o outro, a cidade, virar poeta.

São incompatíveis dois atos tão extremos. São o id e o ego. Lula e Caetano. A cruz e a espada.

Não o cu e a espada, veja bem. Porque estes quando se unem podem no máximo chegar a um harakuru, nunca a um harakiri e a elegância suicida.

O suicídio verbal, por sua vez, é uma prática antiga, oriunda da inexperiência social ou da arrogância monetária. Indivíduos desprovidos de ambas, deveriam evitar essa prática.

Mais apropriado seria cagar e voar, como muitos pássaros. Embora só pássaros sejam animais com asas que conseguem tal feito. Outros não.

Ao cagar e voar, o pássaro pode fugir, ficar longe do alcance até dos comentários de quem foi cagado na cabeça. A própria leveza do pássaro é atenuante. Ahh, cagou! Deixa, é tão bonitinho! Esse passa, passarinho. Já, já vai embora. Pra bem longe da gente.

No reino animal, no entanto, existe uma exceção para todo esse imbróglio. O burro.

Esse caga e anda o tempo todo. Eu, pelo menos, já vi muitos, puxando cangalha dos outros, servindo de burro expiatório. Mas, ele é burro. No máximo sua culpa é culposa e não dolosa.

Bom.

Eu não gosto de princípios da física.

Eu não gosto de cagar e andar.

Eu não gosto de burros.

Eu gosto de cultura. [Lucílio Barbosa]

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Movimento C&A

Houve um tempo em que se caminhava e cantava e seguia-se a canção. Qual canção? A de Geraldo Vandré, claro, “Pra não dizer que não falei das flores”. Nariz-de-cera, óbvio, pra assunto que teima em mal-cheirar.

Vou falar de novo sobre a grande obra de Rodrigues Neto?

Vou.

Tem tanta gente falando bem da admirável Nova Natal da Gente, que não custa ser vozinha dissonante, junto a três ou quatro gatos pingados.

Pois.

O presidente da Funcarte – Fundação Cultural Capitania das Artes – assumiu, sem querer, a liderança de um novo movimento: o C&A. Nada a ver com a multinacional do varejo. A sigla aqui está para Cagando & Andando, Movimento Cagando & Andando do Ryo Grande sem Norte.

Mas, quem diria, Rodrigues Neto uma liderança.

Tendo em vista as demais, tá de bom tamanho.

O movimento C&A tem sido seguido por todos ou quase todos administradores. Questiona-se a frase infeliz do representante máximo da cultura municipal? A alcaidessa finge que não é com ela. Questiona-se se ninguém vai alertar para os perigos da gripe suína na “maior micareta do Brasil”? Nem uma palavrinha das administrações municipais e estaduais, secretarias de saúde, nenhuma sessão na Câmara e na Assembleia. A Destaque, promotora do evento, fica calada, caladinha. Não se deve ir contra os interesses, é a regra.

Cagar e andar, é o mote. Dístico. Brasão d’armas.

Cinco dias depois de expelir a frase histórica, o jovem Rodrigues Neto, 25 anos de jornalismo kultural, enviou carta ao Novo Jornal que divulgou sua filosofia peripatética aos quatro cantos desta City. (Pra economizar o tempo do rapaz, “peripatetikós” é palavra de origem grega, significa “dar uma volta, passear”, e remete aos discípulos de Aristóteles que ensinavam caminhando.)

Que diz Rodrigues Neto em sua missiva?

Dá aulas de jornalismo e confiança, oras. Primeiro explica o que é on e off – jargões jornalísticos – numa entrevista. O primeiro, on, é tudo aquilo passível de ser publicado; o segundo, off, aquilo que se diz mas não se quer que publique. Ancorado “na melhor das relações com todos colegas profissionais”, Rodrigues Neto assume o erro de ter confiado no interlocutor. Confunde coleguismo com coleguismo, pois.

Reclama ainda dos camaradas que, em outros veículos de comunicação, divulgaram versões “de forma depreciativa e injuriosa” sobre a sua pessoa. Precisa comentar? Quem falou que obra enquanto anda, ou anda enquanto obra, foi o próprio – fazer o quê? Se fulano de tal dos anzóis repete a expressão popular não é notícia. Mas se o presidente da Funcarte diz o mesmo é claro que é notícia. Nem precisa estar em nenhum manual de jornalismo, ainda mais nestes tempos em que o canudo de papel pouca serventia tem. Aliás, como bem lembrou o proprietário do Novo Jornal, em entrevista ao portal No Minuto, dia 7 último, “como tenho diploma, posso dizer que diploma aqui não serve nem pra limpar a bunda, porque não é absorvente”.

Jornal – jornalismo – serve pra isso mesmo, também: pra mostrar a merda que os personagens da notícia produzem, enquanto deambulam ou em seus tronos no ar-condicionado das repartições.

Quanto ao presidente, fica a lição: quem caga e anda termina pedindo penico.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Merda de artista


Todo mundo sabe – ou quase todo mundo – que um artistas desses, tidos como porraloucas, um dia resolveu ironizar o mundo glamoroso das artes plásticas e resolveu defecar em latinhas e embalá-las: “Merda de artista” lia-se no rótulo. Pra ser exato, “Merda d’artista”, “Merde d’artiste”, “Artist’s shit” e “Kunstlerscheisse” – em italiano, francês, inglês e alemão, respectivamente, que a merda é uma só em qualquer lugar do mundo, mas as palavras que a representam, não.

O artista era Piero Manzoni, italiano, que morreu dois anos depois de sua – perdão – grande cagada, em 1963. Tinha apenas 30 anos e entrou para a história com a série de 90 latinhas.

Todo esse intróito apenas para comentar o recente episódio envolvendo o excelentíssimo presidente da Funcarte, Rodrigues Neto, que declarou ao Novo Jornal, domingo passado, que estava “cagando e andando pras coisas que dizem sobre mim” – acrescentou o rapaz: “Trabalho há 25 anos com jornalismo cultural”.

Pois.

Apreende-se da informação o porquê muita gente achar a área ambivalente da cultura uma grande merda.

Daí que Michelle Ferret – musa do sobrescrito de velhos carnavais e dias da poesia – resolveu estimular uma campanha para destituir o presidente da cadeira que ocupa (ou seria melhor dizer trono?). O negócio rolou pelo twitter, causando pouca empolgação, como observou Tácito Costa em seu Substantivo Plural.

A verdade é que se alguém da administração anterior cometesse tal desatino, usando expressão chula, grosseira e que evoca maus odores, imediatamente teria grande parte da mídia contra ele. A verdade é que se Ahmadinejad ousasse dizer semelhante despautério seria ainda mais apedrejado do que foi. A verdade é que se o equivalente estadual do indecoroso Rodrigues Neto, o senhor Crispiniano Neto, acenasse com tais palavras, também seria crucificado. Ou empalado. (Aliás, fica a pergunta: quem são os avós desses dois ilustres netos?)

A verdade, então, ou sua parecença, é que a administração municipal de Natal está blindada – ou assim é, se nos parece. As críticas vão e vem na doce cadência do embalo da rede mundial de computadores – blogs, twitters etc. – mas não encontram maiores repercussões.

Pelo cargo que ocupa, a pessoa imediatamente acima do presidente deveria imediatamente, sem pestanejar, demitir o desarranjado intestinal. Com a palavra, a prefeita da City.

Para os artistas, produtores culturais, poetas, magos, prestidigitadores, fica a sugestão: inspirem-se em Manzoni. Cada qual faça sua obra (de arte) numa latinha, marquem horário e levem à Capitania das Artes para uma grande coletiva. O presidente há de adorar.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

A verdade em (quase) poucas palavras


“Rei Lear” – de Shakespeare, quem mais? – foi escrita há 400 anos. Mais ou menos na mesma época em que o rei de Portugal era informado que neste Ryo Grande, “a povoação que está feita não tem gente”. O português Jorge de Araújo, em 1608, tinha uma olaria ali onde é a Praça Augusto Severo, corrijo-me, Largo Dom Bosco.

Todo esse nariz-de-cera é apenas pra lembrar o mote inicial de “King Lear”, uma das grandes tragédias de Shakespeare ao lado de “Hamlet” e “Macbeth”: depois de um preambulozinho onde os condes de Kent e de Gloucester divagam sobre filhos bastardos (“mesmo assim sua mãe era bonita, fazê-lo foi um bom divertimento, e o filho da mãe tem de ser reconhecido”), Lear anuncia às três filhas sua decisão em dividir o reino. As mais velhas, Goneril e Regan, já casadas, enquanto a caçula, Cordélia, era disputada pelo rei da França e pelo duque da Borgonha.

O rei abre o mapa e, provido das melhores intenções, pergunta às filhas qual a que mais o ama – do mérito da resposta, da força das palavras, verá em igual medida, a parte maior do dote dividido.

Goneril começa, alegando que pro seu amor “faltam palavras” – e, na ausência delas, haja comparações: maior que a liberdade, mais valoroso do que a riqueza, mais importante do que a honra, a saúde e a beleza. “Pois bem mais que a tudo eu amo a vós”, conclui a primogênita.

Regan, astuta, pega carona na irmã – tudo o que ela falou e muito mais: “Pois minha única felicidade reside em vosso amor.”

O rei, satisfeito, concede às mais velhas dois terços iguais, um para cada uma, “nada menor em áreas ou riquezas”. Guardou o terço mais polpudo, à caçula, a preferida, aquela que seria seu pouso e repouso final na velhice.

Que tem a dizer Cordélia, para merecer mais que Goneril e Regan?

“Nada, senhor”, é a resposta da moça. “A vós eu amo nem mais ou menos do que é meu dever.”

E segue, questionando a veracidade das palavras edulcoradas das primogênitas: “Por que casam as manas se dizem que só amam a vós? Quando eu casar-me, o que me tomar a mão há de levar consigo meio amor, dever, cuidados; não me caso por certo como as manas, para amar só o pai.”

Como eu não sou inglês, nem nasci em Stratford-upon-Avon, posso resumir as conseqüências das palavras duras e sinceras da menina:

– Fudeu.

Lear pega o terço restante, divide por igual entre Goneril e Regan, e oferece Cordélia aos pretendentes, agora desprovida de dote, senão o próprio orgulho.

O final? O final é mais pra frente. Digamos que, para este momento, para o primeiro ato, o duque da Borgonha se vê surpreendido com a falta de dote. “Mas o preço caiu”, alerta o pai frustrado. “Eu lamento que após perder o pai, ora perca o marido” – é a deixa para o duque sair, literalmente, de cena.

O rei da França questiona: “É muito estranho que aquela até há pouco a preferida, motivo de louvor, seu grande apoio, a melhor, a mais cara, em um instante cometa crime atroz que desmantele tal teia de favores.”

Cordélia intervém, nega que o motivo seja vício, sordidez, desonra ou falta de castidade. O que lhe falta é tão somente a “arte fácil de falar sem verdade”.

O sobrescrito ousa misturar tudo aqui, na confiança de que o leitor há de procurar o texto original para maior deleite, mas o fato é que o rei da França, diante da fria indiferença do seu igual, tem inflamados seu respeito e amor pela donzela repudiada e a toma como rainha. Não sem antes dizer ao concorrente:

– Amor não é amor quando se mescla com questões estranhas.

Quanto ao português Jorge de Araújo, aquele, lá do início do texto, pois, o gajo desistiu da fabriqueta, “convencido de que não seria rico fazendo tijolos”, na descrição romanceada de Cascudo.

Prosa

“Verba volant, scripta manent. A palavra voa, a escrita fcia. Fica: pelo menos pra mostrar como vocês são ignorantes.”

Millôr Fernandes

Millôr definitivo

Verso

“Sei o pulso das palavras”

Maiakovski

“Fragmentos”

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

2009, o ano que marcou o jornalismo potyguar


Foi por pouco, muito pouco. Mais exatamente questão de sete dias, uma semana: se tivessem ocorrido segunda-feira passada (9 de novembro, 120 anos do famigerado Baile da Ilha Fiscal), as duas festas de hoje à noite serviriam como metáfora perfeita pros rumos e prumos e desaprumos do – hoje também famigerado – “Jornalismo Potyguar”. Vamos manter as aspas pra realçar o aspecto abstrato, ou quase fantasmagórico do termo, expressão, definição. Uma incógnita, esse tal Jornalismo Potyguar.

As festas de hoje à noite – e o sabem dez entre dez leitores de jornais, revistas, blogs e twitters – são a deste Jornal de Hoje, sob o comando de Marcos Aurélio de Sá, e a do Novo Jornal, sob o comando de Cassiano Arruda Câmara.

Não acontecem nem no mesmo dia, nem na mesma noite, nem no mesmo horário, à toa. Quem acreditar em coincidência corre o risco de pecar não por ingenuidade, mas por ignorância, ou burrice, mesmo.

É o começo de uma guerra que, se o sobrescrito fosse um sujeito bonzinho e diplomático, disposto a agradar gregos e troianos, se apressaria em apontar entre as hordas cada vez mais minguadas do dito público-leitor seus maiores e verdadeiros vencedores.

Bobagem.

O jornalismo praticado neste Ryo Grande continua acontecendo, como quase o tudo mais, à revelia do público-leitor. E muito mais sintonizado com o fazer diário de uma política cotidiana que prefere ignorar solenemente o público-Eleitor, salvo exceção aqueles períodos eleitorais, ou eleitoreiros, pois.

A comparação com o Baile da Ilha Fiscal, claro, não deve ser tomada ao pé da letra ou da história. O original marcou o fim da monarquia e o início da República. Entrou para a história como uma espécie de precursor do Titanic, enquanto supra-sumo do absurdo: se o transatlântico vai a pique, em 1912, com a orquestra teimosamente tocando suas fanfarras, o Império Brazileyro naufraga de vez entre farta comida e bebidas, excesso de luxo e glamour, tudo embalado alegremente por valsas e polcas, em 1889.

Os anfitriões da noite de hoje sabem que o momento é delicado e dificilmente as festas serão pautadas pelo espalhafato desmedido. Cassiano Arruda foi pego de surpresa no primeiro semestre do ano com a demissão do Diário de Natal, depois de décadas de Roda Viva. Não mereceu nem mesmo uma notinha de despedida no dia seguinte. Marcos Aurélio de Sá viu-se obrigado a sepultar seu projeto de um matutino a preço mais em conta após anos de déficit comercial. Se o primeiro foi mais um entre dezenas de demitidos, o segundo viu-se obrigado, ele mesmo, enquanto gestor, a demitir outros tantos. Aliás, nunca tantos jornalistas foram demitidos neste Ryo Grande quanto neste ano de 2009, ano que viu um Novo Jornal nascer, um Jornal de Hoje renascer e um Diário de Natal definhar vergonhosamente, como um indigente sendo oferecido e disputando espaço com flanelinhas e camelôs nos sinais vermelhos.

(Há quem diga, e é verdade, que a TV Cabugi demitiu bem mais gente, alguns anos atrás – mas estamos falando aqui do velho jornalismo impresso.)

Três dias antes das festividades de hoje, em evento bem menos pomposo, ressalte-se, nasceu também outro projeto editorial que persiste e insiste no formato papel: a revista Palumbo. Não à toa, nem acaso, fruto da colaboração de outros demitidos do Diário de Natal: Albimar Furtado, Osair Vasconcelos e Afonso Laurentino (mais Dácio Galvão e Tarcísio Gurgel). O primeiro número da mensal respira inteligência e bom labor em cada uma de suas 42 páginas. Mas fica ainda a dúvida se terá fôlego pra enfrentar a incredulidade e a aparente falta de interesse dos leitores potiguares. Curiosamente, é preciso dizer, a Palumbo se propõe ao que os três antigos funcionários do DN tinham se esquecido de fazer, há muito, nas páginas do velho diário.

Voltando a falar em demissões, 2009 também foi o ano das demissões de Thaisa Galvão (do Jornal de Hoje), de Laurita Arruda (do Portal da Tribuna do Norte), e de – pasmem – Paulo Macedo. Todas as três sintomáticas. A primeira foi demitida, segundo ela mesma contou, porque a direção do Jornal de Hoje achou que assim ela poderia se dedicar mais ao seu blog. A verdade é que a jornalista, há tempos, era mais blogueira que editora do JH. Já Laurita Arruda foi demitida do Portal da TN a pedido do deputado Henrique Alves, diretor presidente da empresa jornalística, num episódio que curiosamente não teve a repercussão devida, senão no velho disse-me-disse dos cafés e self services.

Já Paulo Macedo – bem, depois de quarenta anos ele bem que poderia fazer como seu ex-colega de DN: investir o dinheiro do FGTS e apostar num novo jornal. Festa, afinal, ele sabe promover.

E, antes que me acusem de estar jogando praga contra um e outro jornal, não estou, absolutamente. Muito antes de ser jornalista, sou leitor de jornal – no formato papel-jornal, aliás. Estou apenas afirmando o óbvio: 2009 será visto, no futuro, como um divisor de águas, no bem ou no mal, para o jornalismo impresso potyguar.

p.s.

Última edição deste JH, última coluna, aos leitores, aquele abraço – me procurem em www.marioivo.com.br

Prosa

“A opinião pública é aquilo que se publica.”

Millôr Fernandes

Millôr definitivo

Verso

“Vocês pensam que é mole viver a enxaguar / A nossa roupa branca nos artigos?”

Maiakovski

“Hino ao crítico”

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: João Hélder

Cultura 141109

Conheci o então estudante de direito João Hélder Dantas Cavalcanti num velho fusca de cor indefinível, onde, no porta-luvas, me fascinava um adesivo com a figura icônica do Che e sua clássica frase “hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás”. Eram os tempos de luta democrática no Centro Acadêmico Amaro Cavalcanti, numa UFRN na qual eu ainda adentrava apenas de carona nos carros familiares, assistindo, de longe, microrevoluções que misturavam num balaio só Maiakovski, Mick Jagger e pranchas de surf. É claro que enquanto irmão, o conheci bem antes – mas isso é outra história, como outros são os tempos atuais e as mais próximas eleições.

por UMA OAB verdadeirAMENTE INCLUSIVA

No momento em que se aproxima a eleição para os novos membros do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, no Rio Grande do Norte, cabe a todos nós, advogados da Ordem, e pela Ordem, realizar uma campanha pluralista e ao mesmo tempo voltada para um interesse comum: a compreensão, o entendimento, de que faz-se mais que necessário resgatar o desejo de uma classe unida.

É claro que só através do debate plural de idéias e projetos, ou seja, justamente a partir de algumas divergências, que se alcançará esse objetivo: a convergência, a união.

Daí a importância do atual período eleitoral, quando a reflexão acerca dos problemas por todos nós vivenciados ganha obrigatoriamente seu espaço, e os rumos e as demandas que a nossa instituição deve priorizar tornam-se evidenciados. É o momento, também, de olhar para trás a fim de que possamos olhar pra frente, avaliando com racionalidade os acertos e desacertos havidos, e qual, ou quais, são aqueles que devem conduzir esse projeto.

Não existem dúvidas quanto às nossas prerrogativas, quanto à valorização e imprescindibilidade da advocacia, quanto ao papel da Ordem na sociedade e a sua contribuição ao fortalecimento da democracia. Não existem dúvidas quanto a vigilância que a Ordem deve exercer sobre o respeito e a defesa da classe, como não restam dúvidas que essa vigilância deve se estender ao Estado Democrático de Direito, atendendo aos reclamos de um Estado Social voltado para a inclusão e edificação de um novo tempo, onde todos terão acesso à produção da riqueza nacional e aos seus resultados.

Sendo assim, nada mais coerente do que realizarmos, no âmbito da nossa instituição, políticas que agreguem – e não que afastem; que construam a participação do jovem e do idoso, dos mais experientes e daqueles que iniciam suas carreiras, das mulheres e dos homens, dos negros, brancos, pardos, ricos ou não – e não políticas que levem à exclusão, à desconstrução, ou à desarticulação; enfim, é preciso a participação de todos para clamar em uníssona voz: A ORDEM SOMOS TODOS NÓS.

Sentir e responder a esse clamor é o dever de todos aqueles que se propõem a guiar a classe e a instituição.

E, para responder a esse clamor, é necessário dizer sim ao sim, e não ao não.

Sim, vamos enfrentar e debater os mais variados temas, incluindo aqueles até agora nunca abordados, a exemplo do arbitramento dos honorários advocatícios pelo Judiciário que, não poucas vezes, agridem nossa dignidade. Sim, vamos realizar seminários e palestras que discutam a sociedade de advogados, as prerrogativas da advocacia, a democracia como valor universal, o desenvolvimento, o mercado de trabalho e a inclusão social, entre muitos outros temas importantes.

Sim, urge dialogar com as universidades e seus cursos de direito, de modo a contribuir com a melhoria do ensino, empreendendo uma luta incansável por remunerações justas aos professores e dignas condições de trabalho.

Sim, é preciso dialogar também com os municípios, o Estado e suas repartições, para adotar justas condições de trabalho e remuneração aos seus procuradores, defensores públicos e assessores jurídicos.

Sim, é possível, ainda, procurar instituições financeiras para subsidiar a juros baixos e com prazo satisfatório de carência, a construção ou reforma, aquisição de computadores e móveis, aos escritórios de advocacia.

Sim, faz-se obrigatória a defesa da sociedade, especialmente dos mais humildes, promovendo a advocacia pública, estimulando debates e conferências nas associações de moradores, nas favelas, mantendo aberto o canal de diálogo com outras instituições em busca da identificação de problemas comuns.

Sim, podemos contribuir na construção de uma Escola de Advocacia que prime pela inserção de todos na defesa dos direitos fundamentais, no fortalecimento de um direito que promova a dignidade e contribua efetivamente na formação de uma classe de profissionais estimulados ao trabalho e vocacionados à solidariedade.

Sim, queremos, e devemos, homenagear os grandes vultos da democracia e da advocacia do Rio Grande do Norte: Luiz Ignácio Maranhão Filho, Jales Costa, Múcio Ribeiro Dantas, Américo de Oliveira Costa, Oto de Brito Guerra, e muitos outros.

Sim, é possível ainda defender a cultura local e construir um diálogo permanente com escritores, poetas, músicos, pintores, com artistas e intelectuais, enfim, que ajudam na construção da nossa identidade potiguar.

Sim, é preciso reconhecer que grandes são os nossos deveres e elevada é a função que nos destina a delicada luta pela paz, pela distensão, pela cooperação entre todos os profissionais do direito e pela construção de um mundo melhor, mundo esse que será nosso legado às próximas gerações para assegurar um futuro mais calmo e feliz para todos. [João Hélder Dantas Cavalcanti]

Prosa

“Acredita você que tudo que se processa à revelia da justiça, ficará docemente sem tribunais e sanções?”

Oswald de Andrade

Ponta de lança

Verso

“Minhas leis são lírios: / lírio-amarelo / lírio-branco / lírio-dágua / lírio-d’alma.

Marize Castro

“Minhas leis”

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Identidade e paisagem


Preocupante, mui preocupante as observações da senhora Ana Adalgiza Dias, diretora executiva do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon-RN), sobre o Plano Diretor desta Capital e mais especificamente sobre a Praia do Meio.

Adalgiza Dias declarou, dia desses ao Diário de Natal, que “o plano diretor também atrapalha o desenvolvimento do local” e que a limitação de até três pavimentos para as construções “acaba engessando o potencial econômico”.

Mas, mais preocupado ainda fiquei quando li essa pérola:

“Por questões paisagísticas, não é permitido a existência de nada que possa tirar a visão do Forte dos Reis Magos, por exemplo. Isso acaba inviabilizando a chegada de bons restaurantes ou hotéis.”

Súbito me veio em mente uma questão relativamente recente envolvendo os católicos e os muçulmanos de Roma, na Itália, claro.

Recente é modo de dizer. Desde os tempos de Mussolini que existia a idéia de se construir uma mesquita na capital italiana – que se confunde, obviamente, com o estado do Vaticano, capital burocrática e imaginária do cristianismo. Como um proto-Berlusconi, Il Duce Benito bradou: “Se queremos uma mesquita aqui, é justo que se construa uma igreja católica em Meca.”

Pio XII não foi muito além nem atrás, lembrando essa condição histórica de capital dos cristãos e, portanto, a necessidade de se evitar, a qualquer custo, “contaminações” com cultos religiosos diversos.

O fato é que foram necessárias quase seis décadas até que em 1995 a mesquita de Roma fosse inaugurada, já sob a condição de maior da Europa, com projeto do arquiteto Paolo Portoghesi e custos bancados pelo Rei Faisal, da Arábia Saudita. Entre os muitos opositores à sua construção esteve o Vaticano, cuja maior preocupação era se a cúpula rivalizaria com aquela de São Pedro e se o minarete não seria demasiado alto. Mexeu-se de cá, mexeu-se de lá, e a Santa Madre Igreja venceu: o Islã – ao menos arquitetonicamente – não está à altura dos Católicos Apostólicos Romanos.

Noves fora a questão pessoal e religiosa de cada um, e o uso maniqueísta, preconceituoso e até racista, o sobrescrito louva a defesa do Vaticano do seu território. Não é uma questão de ser justo ou não, mas defender certos princípios é fundamental para a sobrevivência de qualquer cultura ou fé ou credo. É uma questão de identidade.

Daí que essa não permissão “a nada que possa tirar a visão do Forte dos Reis Magos”, objeto da crítica mui pouco desinteressada dos construtores, é mais que justa. Já fizeram atentado semelhante ao Farol de Mãe Luíza, hoje totalmente encoberto pra quem vai no sentido Areia Preta-Via Costeira. O Farol, inclusive, já foi símbolo de uma mais ou menos recente administração municipal. Resta saber quando os nativos destas ribeyras vão entender que Farol, Forte e outros elementos histórico-urbanos são símbolo maior de nossa identidade e devem se perpetuar muito além e acima das quermesses políticas quadrienais e da especulação imobiliária travestida de desenvolvimento.

*

emer-gente

A prefeitura inova, mais uma vez, com um tal “Plano Emergencial do Turismo”. Vou me socorrer do velho Antônio – diz o Houaiss: “emergencial adj. 2g. referente a ou o que tem condição de emergência.” E, no verbete anterior, “emergência s. f. situação grave, perigosa, momento crítico ou fortuito.”

Eu pensava que o adjetivo se coadunava mais a setores como Saúde, Educação, ou a catástrofes da natureza ou provocadas pelo homem (tsunamis, saques etc.).

“O turismo de Natal será tratado como política de Estado”, foram as palavras ouvidas – sem tradução simultânea – em Lisboa, Portugal, alguns meses atrás.


Sendo assim, me parece que toda a administração, não só municipal mas estadual, está sob este signo.

palumbo & tico

Osair Vasconcelos e boa companhia lançam hoje a Palumbo, na Fiern, 18h – boa ocasião pra rever amigos & inimigos.

Mesmo horário, aliás, em que a Academia de Letras homenageia o músico Tico da Costa, com venda de CDs em prol da família. É ir pra um, e depois pro outro. Obrigatório.

ora, raios

Acompanhar minuto a minuto, pelo twitter, o “drama” do vereador Ney Lopes Jr. tentando embarcar para os EUA, foi de uma importância enorme para os destinos desta Capital. Um raio caiu na aeronave do rapaz.

Pena não poder ter sido retuitado. O raio, digo.

salve, jorge

Jorge Mautner na City, domingo – mais exatamente na Ribeyra. Diz o release que no Largo Dom Bosco. Eu já tô ficando confuso: não lembro mais se Woden Madruga reclamou ou não da extensão do nome do Largo – antes restrito às proximidades do Salesiano – ou se a área ainda tem o nome de Augusto Severo, se é uma praça, um largo, um campo de pouso ou simplesmente terra devastada sem memória.

Noves fora, Mautner, de grátis, lá pelo final da tarde dominical, é imperdível.

Prosa

“Ora, tudo tem seu tempo. A humanidade processa dialeticamente sua ascensão.”

Oswald de Andrade

Ponta de lança

Verso

“Preciso do antigo: / do que se transformou em céu / e se fez floresta.”

Marize Castro

“Argentêa”