quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Retrospectiva 2008 (II)

Seguindo a retrospectiva iniciada ontem, seguem os seis derradeiros meses do ano que está findando, hoje, logo mais à meia-noite. Não custa contrariar a regra e inserir neste rol último mais um fragmento do segundo mês do ano, fevereiro – numa segunda, 18, o discípulo Marcelus Bob falava sobre a morte de Thomé Filgueira:
“Do atelier, recorda a liberdade extrema concedida pelo mestre, que repercutia nos discípulos como segurança e auto-estima, e o seu senso de coletividade: ‘Uma mão lava a outra, ensinava o professor Thomé – ele dizia que se um colega está em evidência, devemos ajudá-lo a se firmar no mercado, para o fortalecimento de todos. O contrário do egoísmo barato que permeia as artes plásticas potiguares’, recorda Marcelus Bob, concluindo:
‘Todos os grandes nomes da chamada Geração 80 do Rio Grande do Norte – devemos a Thomé, o grande baluarte do impressionismo potiguar.’”


JULHO
“Verdade seja dita: é uma interpretação de responsa. Tão boa que, metido no corpo nauseabundo do vilão, Ledger tinha mais é que morrer depois: não apenas parecia – era já um defunto vivo. O corpanzil (1,85 metro, me informa o Google), a cacunda, as roupas sujas e esfarrapadas, os cabelos ensebados – tudo que o ator incorporou pro seu personagem insinua que a qualquer momento um pedaço de dedo, braço, ombro, carne, pode se separar do corpo e ir ao chão. Assim: o retorno dos mortos-vivos num leprosário. Asilo Arkham.” [segunda, 28, sobre o último filme do Batman]
AGOSTO
“Então você vai viajar. Mais uma vez. Parte da nossa vida foi de encontros e despedidas em aeroportos. Um gosto amargo, não de fim, mas de pausa. Pausa até o próximo encontro. Até a próxima despedida. Tão rápido o tempo, entre o primeiro e a segunda, tão lento entre a segunda e o primeiro. Entre os dois – nós, flutuando no ar como numa valsa cósmica e atemporal. Aquela, que não dançamos nos seus 15 anos.” [segunda, 4, sobre mais uma viagem da primogênita]
SETEMBRO
“Mas, bebendo noite desses um vinho italiano desprovido das hipérboles citadas anteriormente, percebi que não há mais espaço em nossas adegas para vinhos discretos, sem glamour aparente, sem o chacoalhar ruidoso das jóias cintilantes – que são os tais taninos, os tais sabores frutados, os tais bouquets de perfumaria chic.
Falta-nos, ainda (e isso é apenas uma opinião não tabulada) a percepção de que o ingrediente máximo em qualquer degustação que se preze – e que independe de garrafa, rolha ou nota fiscal – é o prazer mútuo de uma boa companhia, capaz de transformar qualquer vinho em um... ‘Almaviva’, só pra ficar num exemplo unânime.” [segunda, 29, sobre a arte de beber vinhos em boa companhia]
OUTUBRO
“Derna então, antecipando o próximo 2 de janeiro, vivemos no melhor dos mundos, numa Graceland, numa Wonderland, num comercial da Barbie – falta só a placa de boas-vindas na entrada da cidade, BR-101, próxima ao rabo do cometa-estrela e aos Três Reis Mágicos: ‘Welcome to the Barbie World’.
O lugar onde as meninas têm cabelo escovado e os meninos músculos bombados.
Onde quem ainda fuma usa piteiras.
Onde quem bebe obviamente não bebe cachaça.
Onde os dentes são mais brancos, os sotaques mais pronunciados, os saltos os mais altos, as unhas mais compridas, a moda mais fashion, os vinhos mais encorpados, os champanhes mais borbulhantes. Onde os táxis são Land Rover, os pulsos pulsam Rolex, os dedos alisam a tela de iphones, comprados em Miami ou Manhattan, como exige o kit-maracatu cantado por Eliana Lima.” [segunda, 13, sobre a vitória de Micarla de Sousa]
NOVEMBRO
“Já o artista Diniz Grilo, pouco mais de meio século de existência, nunca precisou se revoltar contra nada tão grave quanto a violência do racismo oficializado ou a máfia organizada. Mas morreu vítima – por que não dizer – da violência que se instaura, extra-oficialmente, nesta Capital Espacial. Que está mais próxima do circuito Londres-Berlim-Madri do que se imagina, trampolim da droga que começamos ser.
Ironicamente, Diniz morreu graças ao choque de gestão e direção de uma viatura policial, que deveria estar procurando os bandidos que vingam por aqui feito mato – ou cruzes – nos canteiros centrais.” [quarta, 12, sobre as mortes de Diniz Grilo, aqui, e Miriam Makeba, alhures – esta última após um concerto contra a máfia italiana]
DEZEMBRO
“Mas, vamos ao que interessa: a essa altura do campeonato tem muito neguinho entoando o melô de ‘Madagascar’, e se remexendo esquizofrenicamente pra saber quais dos muitos convidados serão alguns dos poucos escolhidos.
Então, todos juntos: ‘Eu me remexo muito/ Eu me remexo muito/ Eu me remexo muito/ Remexo...muito!!// Eu me remexo muito/ Ele remexe muito/ Ela remexe muito/ Nós remexemos muito/ Eles remexem muito/ Você remexe muito’.
Madagascar é aqui.” [segunda, 15, sobre a composição do neo-secretariado municipal]



PROSA
“Não presumas do dia de amanhã, porque não sabes o que ele trará.”
Salomão
Provérbios
VERSO
“Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso”
Caetano Veloso
“Oração ao tempo”

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Retrospectiva 2008 (I)

Entra ano sai ano e as retrospectivas servem, supostamente, para espanar o pó da memória, acumulado nos mais de trezentos e sessenta dias e noites. Sem muito esforço, pinço daqui, pinço daculá, algumas abobrinhas escritas e publicadas aqui nesta coluna – que continua, claro, amanhã.

JANEIRO
“Sarkozy é a tradução francesa para a malandragem. Explicita e explora ao máximo a sentença de que por trás de um grande homem existe sempre uma grande mulher. E, no seu caso, literalmente: informam as folhas que tudo sabem que a femme é alta alguns centímetros a mais que o garçon. Em tempos de vulgarização globalizada, são a nova versão para o par Sartre-Beauvoir. Até que dure.” [segunda, 7, sobre o casal Bruni-Sarkozy]
FEVEREIRO
“Descubro que ‘Alças de agave’, o livro prometido de François Silvestre não revela muito mais do que já se sabia. Sobre o folioduto – que eu prefiro como foliaduto. François nomeia algumas reses, mas omite também alguns nomes do rebanho. O saldo, embora positivo, termina enfraquecido por essas ausências. Ao pisar em ovos, naturalmente quebra alguns. E mostra-se, ao longo das três centenas e meia de páginas, tão desiludido quanto enganado. Enganado pela governadora Wilma de Faria, pelos assessores diretos – alguns deles amigos pessoais –, mas enganado, principalmente, por ele mesmo, caçador de abelhas, criador de preás, servidor de pato na bandeja político-eleitoral. ‘O pato é um dos poucos animais que anda, corre, nada e voa’, escreveu, relembrando a campanha que levou Dona Wilma ao governo.” [sexta, 29, sobre o lançamento do livro do ex-presidente da FJA]
MARÇO
“Desculpe o lugar-comum, João, a escrita banal, mas a esta cidade lhe interessa mais os cifrões que as letras. As letras são um estorvo, ainda mais encarreiradas sobre o espelho embaçado ou no mármore polido do lavabo.
Os cifrões são redenção & religião.
E de nada vale lembrar que o dinheiro não se come. Como não? Estamos empanturrados, nos fartamos dia após dia em 30, 35, 300, 350 moedas de ouro. Esta é a Cidade dos Reis, João, la Ciudad de Los Reyes, dos historiadores d’antão, a perspectiva indefinida, de Cascudo.
E aos Reis não lhes é permitida a existência sem a vassalagem e tampouco sem a porção podre da corda – os mendigos. Aqui, mais que em qualquer outro lugar do mundo, a mendicância é a serventia da poesia.” [sexta, 14, em carta aberta ao poeta João Gualberto]
ABRIL
“Incrível, por que inacreditável, por que fantástico, extraordinário, extravagante, ridículo: leio num portal de notícias uma pequena manchete acompanhada de foto e tudo – ‘Depois do jantar, Caetano passa no mercado’. Clico em cima, a foto se alarga, vê-se o entorno do músico, em primeiro plano um caixa vazio de supermercado, mais adiante uma gôndola baixa com frutas – laranjas, laranjas, maçãs, vermelhas e verdes, e outras que não identifico –, e por trás dela um Caetano alheio ao fotógrafo, digo, paparazzi, rosto tranqüilo, de flâneur urbano, de flâneur de supermercado. Falta só o vento, a praia, o calçadão para compor com seus versos: ‘Caminhando contra o vento, sem lenço sem documento...’ Invés, ou quase isso, a didascália informa: ‘Tranqüilo, Caetano caminha perto das melancias.’” [sexta, 25, sobre o culto besta às celebridades]
MAIO
O que se pode questionar aqui é a definição por um partido (trabalhista) que nunca manteve uma relação clara com o dito Governo de Todos (socialista): a ambigüidade permeou a relação do PT estadual com o PSB estadual, bastando citar as Secretarias da Saúde e da Cultura (leia-se Fundação Zé Augusto). Nem um nem outro demonstrou algum esforço pro acerto dar certo. Findou-se escolhendo uma candidata que, noves fora a competência e o prestígio federal, não parece ainda agregar nem um nem outro lado, cada qual isoladamente, quanto mais de fazer uma ponte que una as duas margens e dure ao menos a barra-pesada de um processo eleitoral.
Tudo, graças à demora em se definir um candidato de consenso e, paradoxalmente, pela ligeireza com que se encontrou esse mesmo nome. [quinta, 8, sobre o apoio de Wilma de Faria à candidatura petista]
JUNHO
“Mas, corrijo-me enquanto é tempo: a crendice é universal – ‘A cidade mais supersticiosa do mundo é justamente New York, a maior, mais rica e mais povoada de universidades e propagandas’, já denunciava Seu Luís da Tavares de Lyra. Daí que a Polícia Federal batizou sua operação pegando carona no supra-sumo da superstição – a mitologia grega.
Foi uma festa na Capital Espacial do Brazil: caso não se recupere nem um mísero tostão dos propalados 36 milhões, caso não se prenda nenhum do Clube dos 13 por mais que alguns escassos dias (as penas, informa o sítio da PF, comprovadas as culpas, podem chegar ao máximo de 65 anos), ao menos a operação servirá a algo – ninguém agora desconhece a deusa Hígia, e todos sabem de onde vem “higiene”. Uma beleza. [segunda, 16, sobre a Operação Hígia, deflagrada na sexta-feira, 13]



PROSA
“Querer ser de seu tempo é estar, já, ultrapassado.”
Ionesco
Notas e contranotas
VERSO
“O tempo o mesmo tempo de si chora.”
Camões
Sonetos

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

O senhor Kitano e Il signore Volonté

Sexta passada fui assistir “Glória ao cineasta”.
Sexta passada fui ao lançamento de “Lira de viagem”.
“Glória ao cineasta” foi dirigido por Takeshi Kitano. Em 2007.
“Lira de viagem” é um apanhado de textos pelas mãos de Volonté. Poeta. Maldito. Não necessariamente nesta ordem. É dest’ano, 2008.
Este filme de Kitano não é como um filme de Kitano – aliás, essa é a sua premissa. Kitano dirige a si mesmo e se mostra como provavelmente se encontrava, então, à época: um cineasta em crise. Sem querer repetir o gênero que o havia consagrado (inclusive com um Leão de Ouro ao Festival de Veneza, com “Hana-bi”), ou seja, filmes violentos sobre a Yakuza, a máfia japonesa, o diretor tenta outros gêneros – filmes de época, dramalhões, filmes de terror. Os resultados são ridículos e risíveis. Termina por enveredar na ficção científica, e é aqui que o “filme dentro do filme” ganha mais força e tempo.
Este livro de Volonté não é um clássico livro de Volonté. Até porque não existe isso de clássico livro de Volonté. Volonté é seu próprio livro. Ambulante. Deambulador. Deambulatório. Alguém já definiu o poeta como “peripatético”. Ou seja, alguém que, à moda de Aristóteles, ensina ao caminhar. Talvez porque o poeta é visto ao mesmo tempo em vários pontos da City. Pode estar arrastando a sandália entre as estantes da Poty Livros da Felipe Camarão e, minutos depois, exibir sua camisa pólo entre as gôndolas da livraria do Midway. Termina, pois, o livro de Volonté, com dois poemas de Volonté. O último, parece, já antológico para a intelligentzia da City: “No começo/ era o verbo/ depois chegaram os canalhas”. O sobrescrito prefere “Red”, dois versos: “A traição/ era fogo”.
Kitano faz uma bela homenagem aos cineastas japoneses – logo no início leva um boneco que representa a si mesmo para uma bateria de exames: tomografia computadorizada, endoscopia, o escambau. A cada exame surge um novo nome na ficha do paciente: Yasujiro Ozu, Akira Kurosawa, Shohei Imamura, todos grandes cineastas japoneses.
Volonté homenageia ao seu modo os participantes da antologia: tem Napoleão de Paiva, tem Octavio Paz, tem Woden Madruga descrevendo o Sertão de Alex Nascimento.
Sexta passada fui assistir “Glória ao cineasta”. Kitano estava lá, na tela, com seu olhar de peixe-morto, como seu humor japonês, com seu surrealismo ácido e particular – não é preciso terminar o filme para pensarmos, nós com nós mesmos, no escurinho do cinema: “Muito doido”.
Sexta passada fui ao lançamento de “Lira de viagem”. Cheguei nem tão atrasado assim: mas o poeta não estava lá. Nem sua barba por fazer, nem sua mão abraçando a cabeça de fios pretos e fios brancos, nem seu ranço real contra inimigos imaginários. A mesa de autógrafos o canto mais limpo. Só mesmo Volonté, para contrariar sua própria onipresença.
*
THE SPIRIT
Estou quase aprendendo a escrever o nome da atriz sem precisar consultar o google: Scarlett Johansson reaparece em mais um filme, e, desta vez, mais um filme inspirado numa história em quadrinhos – “The Spirit”, criação de Will Eisner. A atriz é Silken Floss, assistente do malvado Octopus (Samuel L. Jackson).
Não é a única femme fatale: Eva Mendes interpreta Sand Saref, uma ladra de jóias e namoradinha de adolescência do herói, e Paz Vega é Plaster of Paris, uma dançarina.
O filme é dirigido pelo também desenhista e autor de quadrinhos Frank Miller.
THE MYTH
Começa amanhã e vai até domingo, 4, o Umbria Jazz Winter (não confundir com o tradicional Umbria Jazz, que acontece no verão italiano, em Perugia). Este, como o nome indica, é invernal, e se realiza em Orvieto.
A 16ª edição será dedicada à Bossa Nova. João Gilberto (tratado nominalmente e literalmente como “O Mito”, assim, em português) faz três concertos seguidos – 2, 3 e 4 de janeiro, no Teatro Mancinelli, com preços, digamos, pra lá de salgados: enquanto para outros artistas o ingresso custa entre 20 e 30 euros, para assistir “O Mito” deve-se desembolsar entre 50 e 110 euros.
ANOVO
Dou uma geral nos réveillons do Arraial (ao menos aqueles que me chegam via assessorias de imprensa): tem um, mais “família” no Novotel Ladeira do Sol, com vista para a queima de fogos da Praia dos Artistas.
Outro, na mais-que-famosa “Arena do Imirá” (um tormento para quem circula pela Via Costeira, com bêbados cruzando a estrada etc.) – este tem Ara Ketu (axé music), Arreio de Ouro (forró), João Teimoso Rock Band (pop rock).
ANOVO II
Talvez, talvez, seja melhor guardar o dinheirinho e embarcar nos pacotes de viagem organizados pela Pedrassoli Turismo: em janeiro tem Elton John (dia 17) e Alanis Morissette dia 30. Em março, o metal pesado do Iron Maiden (dia 18), desta vez mais pertinho deste Ryo Grande: em Recife.



PROSA
“mas, se tantos homens em quem supomos juízo, são reclusos por dementes, quem nos afirma que o alienado não é o alienista?”
Machado de Assis
O alienista
VERSO
“Quando um grande da corte fica louco,
Para o vigiar todo cuidado é pouco.”
Shakespeare
Hamlet

sábado, 27 de dezembro de 2008

Dos cartões de Natal

Em mais uma sessão “Saudade-Não-Tem-Idade”, a coluna debruça-se sobre o passado repintado em tintas edulcoradas:
Ah, como eram belos os cartões de Natal!
Lá em casa, por exemplo, eram arrumados de mil e uma maneiras – às vezes embaixo da árvore de bolas coloridas, às vezes entre as próprias bolas como se enfeites fossem, em outras ocasiões dispostos uns sobre os outros na mesa de centro.
A maioria era de amigos de meus pais, poucos, as exceções, de empresas ou políticos.
Tinham formas diversas, tamanhos diferentes, ilustrações ímpares. Os clássicos reproduziam cenas do presépio, focadas na Sagrada Família: José e Maria rezando em torno ao Menino Jesus, este, todo serelepe, de olhos bem abertos, braços abertos recordando o abraço e a cruz do sacrifício futuro.
Não lembro quando surgiram os cartões exóticos, mas estes traziam desenhos de bonecos de neve e outras cenas invernais. Já não era mais o motivo original, o nascimento do Cristo, mas a sua celebração ocidental, em países europeus onde o inverno coincide com o mês natalino.
Antes, fazendo a passagem natural entre o clássico e o exótico, fronteira indefinida, aqueles que traziam o Papai Noel, quase sempre sorridente e bonachão, gordo, a barba branca e vasta, a roupa encarnada.
Depois, surgiram os cartões com motivos vários, indiretamente ligados ao Natal e às suas representações: eram os simplesmente decorativos, entre os quais, aqueles com desenhos infantis ou que simulavam o traço comum das crianças.
Com a internet e o celular, quase ninguém manda mais cartões de Natal, ao menos aqueles de papel e envelope e tal.
Este ano, o sobrescrito ganhou alguns (e, ferreiro que sou, usando espeto de madeira, não enviei nenhum pelos Correios). O do Banco do Nordeste traz fotos de praias do Nordeste – um menino dando cambalhotas em dunas que poderiam ser as de Genipabu, uma tartaruga marinha, a silhueta inconfundível de um daqueles picos de Fernando de Noronha.
A Legião da Boa Vontade enviou as clássicas fotos de meninos e meninas multirraciais, sorridentes e esperançosos, todos limpinhos e fardados.
O FestNatal anuncia como próxima exibição o ano de 2009, iluminado pelos holofotes das celebridades de Hollywood.
Também sorridente e com os dentes que bem poderiam propagandear algum Colgate ou Kolynos, a neo-vereadora eleita Julinha Arruda (só o rosto) deseja um novo ano cheio de felicidades.
Que mais, que mais? Não muitos, ao menos no papel impresso. Daí que destaco um, virtual, do deputado Fernando Mineiro, não exatamente pelo remetente, tampouco pelo partido, me apresso a evitar os dentes das hienas: mas pela bela ilustração de Marcellus Bob e pelo texto de Carlos Drummond de Andrade, sempre drummondiano.
*
QUEIXA
O sobrescrito não conhece pessoalmente Rosa Moura, assessora de imprensa da Afundação Zé Augusto, mas desde já a tem muito em conta: como o nome indica, defende, não com unhas e dentes, mas com perfume e espinhos a instituição sua cliente, o que é muito louvável, claro.
Tudo porque o chato aqui empacou diante do fê-é-fé maiúsculo da Festa.
Não, cara Rosa (a rosa é uma rosa é uma rosa é uma rosa, já ensinava Gertrude Stein): a crítica do sobrescrito não é ortográfica ou mesmo gramatical – apenas não acredito que a atual gestão possa se orgulhar de nada com letras maiúsculas.
No mais, você está coberta de razão, inclusive ao me desejar “Boas festas!”, desejo sinceramente compartilhado.
PET SHOP
E por falar em soltar os cachorros, os caninos estão com tudo nos cinemas: tem Bolt, o supercão, em desenho superanimado, e o bésti-seller Marley (inspirado em “Marley e eu”).
Tem também os caninos do vampiro Edward Cullen no pescocinho de Isabela Swan, no arrasa-quarteirão “Crepúsculo”.
(Embora eu aposte no japonês Kitano em “Glória ao cineasta” – Moviecom, 17h15).
MARAVILHA
Antes tarde do que nunca, já está aberta a exposição “Maravilhas mecânicas de Leonardo da Vinci”, na Biblioteca Pública Câmara Cascudo.
Leonardo foi um dos primeiros a separar a arte da ciência, criando sua própria metodologia de pesquisa científica, formulando e testando suas hipóteses através dos desenhos e projetos, muitos dos quais aparecem nesta exposição, na forma de maquetes criadas pelo engenheiro italiano Roberto Guatelli. Lá estão: o anemômetro, o higrômetro, o casco fusiforme, o projetor, a metralhadora tripla, a válvula mitral, a churrasqueira, o navio de pás giratórias, o relógio, o carro automotor, a prensa automática, o medidor de resistência de materiais, um sistema de rolamentos, o ornitóptero, e um polidor de lentes.
E, bem antes que a Borboleta pousasse por aqui, Arraial de Giacomo, idealizou um “Cidade Ideal”.
A coordenação geral é da Fapern e a mostra deve percorrer ainda Caicó, Mossoró, Nova Cruz, Pau dos Ferros e Santa Cruz.
A MELHOR
É hoje, logo mais às seis da tarde, no lusco-fusco da tarde-noite, hora do ângelus etc, que a cantora Khrystal volta ao local onde tudo começou: o Bardallos, barzinho ali pelo Centro Histórico e Histérico deste Arraial.



PROSA
“A alma ordena o querer; não ordenaria se não o quisesse; no entanto, não executa aquilo que ela mesma ordena.”
Santo Agostinho
Confissões
VERSO
“A gente não sabe nunca ao certo onde colocar o desejo”
Caetano Veloso
“Pecado original”

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Minha Mãe

Será uma surpresa, talvez, para aqueles que não gostam do sobrescrito (os há, os há), saber que, sim, também eu tenho uma mãe.
Com nome e sobrenome, claro, embora mãe é mãe e basta o substantivo, nome, título. Por isso que coloco logo lá em cima, “minha mãe”, pois assim aprendi a chamá-la derna que desandei a falar – muito pouco, diga-se a verdade. E deixo pra cá pra baixo a revelação de seu nome: Maria Crinaura. E sobrenome: Dantas Cavalcanti – aquele de casada – e o de solteira: Freire Alves.
Mas, tal qual aquela resposta de João, o Batista, a quem o tomava por Cristo, não sou digno de desatar a correia das alparcas de minha mãe.
Por isso e por que é Natal (ontem, hoje, sempre), antecipo o tradicional café-da-manhã do sábado. E, por que é Natal (ainda é Natal, deveria ainda ser Natal), publico texto da minha mãe. Nem tão inédito assim. Foi escrito lá pelo início da década de 70, lá se vão três décadas, quase quatro. Com ele, ela ganhou um prêmio de uma revista feminina, nacional – não lembro se Cláudia ou Desfile, patrocinado por uma marca de cosméticos; mas lembro bem que durante muito tempo uma enorme caixa com perfumes, sabonetes e que tais ficou guardada em algum canto da nossa casa. Até que os perfumes e sabonetes foram sumindo, restou a caixa, até que ela também sumisse, permanecendo apenas em nossas lembranças o cheiro inesquecível da infância e dos acontecimentos mágicos da infância.
Também, há uns seis anos, um dos meus irmãos e eu cultivávamos, juntos, o sonho de uma cachaça artesanal de alambique, de qualidade: pois, usamos o texto materno para um cartão de Natal simpático, idos de 2002.
Pouco há a acrescentar ao texto abaixo. Nas entrelinhas, o retrato de uma típica família média potyguar, pai, mãe, quatro filhos. Uma família como muitas. Um período como poucos, denunciado por palavras-chave como “Dodge Dart”, ou “hippies”, onde ainda o principal do Natal era o aniversariante.
Numa palavra: Saudade.


UM NATAL DIFERENTE
Sempre planejo um Natal diferente. Que não seja pré-fabricado, que fuja à tradição no que ela tem repetido e copiado. Que nesse Natal só fique mesmo o que é autêntico, que traduza nossa alegria pelo nascimento do Menino, alegria pura como a água da fonte, correndo e cantando uma doce canção ao filho de Maria.
Bem, quero um Presépio vivo. Maria, José, o Menino, o boi, o burrinho, pastores, ovelhas, e até a estrela, seriam gente. Meus filhos, os seus amigos, eles mesmos escreveriam a seu jeito um Auto de Natal. Nós adultos nada faríamos a não ser quando chamados, quando solicitados.
E fico a imaginar a beleza da festa, a autenticidade da mensagem da Criança, interpretada por outras crianças! A linguagem simples, onde os erros de concordância seriam compensados pela riqueza do conteúdo e pela graça da interpretação.
Que cantos cantariam os pastores? Que palavras diria a Mãe do Menino, para consolá-lo do frio da noite, da dureza do berço improvisado?! Quem seriam os Magos?! Trariam ouro, incenso e mirra, ou um chocalho colorido, ou um saco de balas?
Ah, eles fariam tudo. Poderiam cantar desentoado, poderiam chegar vestidos de palhaços ou “caubói” de barba, ou hippies, mas na manjedoura o Menino sorria ao vê-los entrar. Talvez um burrinho “de mesmo” invadisse a casa, talvez arrancassem do céu o cometa que se aproxima e conseguissem fazê-lo parar em frente à pequena cabana do nascimento. Mas seria uma cabana? Ou colocariam seu pequeno posto de gasolina de brinquedo para abrigar o Deus Menino? Bem, talvez achassem melhor que os Magos viessem num Dodge Dart, vermelho ou azul, ouro ou prata, mas sempre colorido como seus sonhos infantis.
A festa não teria hora para começar nem terminar. Seria a festa das crianças para A Criança. E certamente algum pastor caminharia para o Presépio cantando uma música de Roberto Carlos, enquanto outro, sorridente, entraria na gruta tendo na mão uma garrafa de refrigerante e mastigando gulosamente um cachorro-quente.
E nós adultos? Poderíamos ser “convocados” ou esquecidos, mas guardaríamos na lembrança as imagens esplêndidas desse Natal. E entre dormindo e acordados, entre o sonho e a realidade, víssemos de repente o Menino crescer, levantar-se e correr com os nossos pela casa, irmãos de nossos filhos, filho nosso também. [Maria Crinaura Dantas Cavalcanti]



PROSA
“E, entrando o anjo aonde ela estava, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo; bendita és tu entre as mulheres.”
São Lucas
O evangelho segundo Lucas
VERSO
“não há redenção
há o deserto”
Adriano de Sousa
“João Batista”

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Amazing Natal

Me desculpem, mas este Natal nem Natal parece.
Eu sei, eu sei. As luzes coloridas continuam balançando nas árvores, noite ou madrugada adentro, o vento passeando ondas luminosas entre os galhos e as folhas.
Eu sei, eu sei. Nos corredores dos shoppings, as sacolas seguem, ondulando pra lá e pra cá, pra frente e pra trás das pernas dos passantes, pendulando desejos insaciáveis, e muitas vezes inconciliáveis, entre almas e corpos. Ou entre os corpos e os bolsos que os vestem.
Eu sei – eu ainda sei. Seus filhos já escreveram para o Papai Noel no Pólo Norte (e alguns já trocaram os hemisférios e garrancharam um “Pólo Sul” no dorso do envelope), pedindo a boneca, o trenzinho, o carrinho de rolimã.
Ah, eu já não sei. Não. Aqueles eram outros meninos, de outros tempos e lugares-comuns, quando havia ainda carrinho de rolimã, trenzinho e boneca.
É certo que as bonecas ainda resistem – mas como evoluíram, em todos os sentidos: as meninas de hoje, por exemplo, querem a boneca Ananda, aliás Amazing Ananda, ou seja, Ananda “Maravilhosa”, setecentos reais a unidade (R$ 699,99, pra ser exato), acompanhada dos seguintes acessórios: “um lindo vestido e sapatos, camisola, prato de espaguete, macarrão e cereal, todos com um lugarzinho para encaixar a colher, caixa de suco, biscoito, tortinha, pizza, escova de dentes, escova de cabelo e peniquinho.”
Bueno, depois de menu tão farto, não poderia faltar o peniquinho.
A descrição do brinquedo segue, detalhada, acompanhada de instruções e conselhos para o uso: “Nenhuma outra boneca é capaz de interagir tanto quanto Ananda. Ela reconhece a voz de sua ‘mãe’, envolvendo-a na brincadeira de forma inovadora e divertida! Ela ri, fala, chora, brinca e pede abracinhos. É uma brincadeira de mamãe e filhinha que você nunca viu! Ela reconhece a voz da ‘mamãe’!”
Uau! O “monstrinho” cibernético não parece sua própria filha? Ou nós mesmos? Afinal, rir, falar, chorar, brincar e clamar por abraços não é nossa lida diária?
Deixando a Amazing Ananda de lado – ou melhor: dormindo um soninho sossegado, um ronquinho quase inaudível acompanhando o inflar e desinflar do peito –, por que o sobrescrito continua achando que esse Natal nem Natal parece?
Não sei. Falta eletricidade no ar. Falta alegria, mesmo aquela travestida em consumismo desenfreado. Será a crise mundial espraiando seus tentáculos. Será aquele verso final, frase-síntese de Machado de Assis, tão antiga, sempre atual: “Mudaria o Natal ou mudei eu?”
*
SONETO
Na íntegra, o soneto machadiano: “Um homem, – era aquela noite amiga,/ Noite cristã, berço no Nazareno, –/ Ao relembrar os dias de pequeno,/ E a viva dança, e a lépida cantiga,// Quis transportar ao verso doce e ameno/ As sensações da sua idade antiga,/ Naquela mesma velha noite amiga,/ Noite cristã, berço do Nazareno.// Escolheu o soneto... A folha branca/ Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,/ A pena não acode ao gesto seu.// E, em vão lutando contra o metro adverso,/ Só lhe saiu este pequeno verso:/ ‘Mudaria o Natal ou mudei eu?’”
MAIS DO MESMO
Ou seja, depois de tal soneto, qualquer crônica sobre o Natal torna-se inútil e redundante – e haja perturbar o velho bruxo na sua tumba, citando sua célebre questão.
NHEN
Mas outros poetas também merecer ser perturbados em épocas natalinas, todos batendo na mesma tecla com outros versos – Fernando Pessoa: “Nasce um Deus. Outros morrem. A Verdade/ Nem veio, nem se foi: o Erro mudou./ Temos agora outra Eternidade,/ E era sempre melhor o que passou.”
-NHEN-
O velho Drummond: “Menino, peço-te a graça/ de não fazer mais poema/ de Natal./ Uns dois ou três, inda passa.../ Industrializar o tema,/ eis o mal.”
-NHÉM
Nei Leandro (de Castro), por tabela e fugindo do nhenhenhém e cutucando a ferida: “As meninas da Rua 25 de Dezembro,/ expostas ao odor e à fúria da maresia,/ expõem seus corpos em plantão permanente./ Não querem piedade. Querem foda./ Querem vinte, trinta dinheiros,/ em troca do corpo infantil que a maresia/ está corroendo até a morte prematura.”
Lembrai-vos das meninas da 25 de Dezembro quando quebrarem as castanhas e erguerem as taças.
ZUNZUNZUM
Intervalo para notícias da Funcarte: além de Bob Pai e Bob Filho, aka Carlos e Alex de Souza, há um terceiro nome cotado para a Brouhaha: Hayssa Pacheco, do DN, o que seguiria a estratégia instaurada por Dácio Galvão de “um pé lá, outro cá”.
FINAL
Por derradeiro, mas nem por isso menos importante, me aproprio do “Poema para o Natal”, de Bosco Lopes, para seguir retribuindo, a todos, os votos que por aqui chegaram:
“AMIGO, SOMENTE O FINAL DO POEMA/ COLORIDO ESTRELADO/ MANEIRA ÚNICA DE LHE DIZER/ FELIZ NATAL”.



PROSA
“Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam.”
São João
O evangelho segundo João
VERSO
“Fui ser feliz.”
Lisbeth Lima
“The end”

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

O vestido de Julinha Arruda e o preto básico da Sargento Regina

Bom, crianças, vou logo alertando: lavo minhas mãos sobre o que vou escrever nas próximas linhas. É segunda-feira, e as segundas-feiras, todos sabem, são terríveis. Já o tema, anunciado aos quatro cantos a partir do título acima, de terrível nada tem.
Ou tem.
Depende do ponto de vista.
Do lado da notícia etc.
Acho que não. As neo-vereadoras souberam aplicar a regra da elegância. Ambas.
O momento foi durante a cerimônia de diplomação. Semana que passou. Passado. O sobrescrito não estava lá. Mas de tanto ler a notícia nos blogs da vida, nas folhas virtuais, e ver as fotos, foi como se estivesse.
Daí não concordar com o que disseram: que o vestido de Julinha era uma minissaia. Não. Não. E não. Se fosse, a notícia realmente iria além do Arraial: a coluna de Ancelmo Gois, no Globo, a coluna Radar, de Veja, até o vetusto Elio Gaspari, da Folha, todos anunciariam o feito, visão etc. Seria o fim da crise mundial. Larry Rohter num instante ia pedir ao New York Times o retorno aos Tristes Trópicos e ao presidente Lula o perdão abstêmio. Seria não o fim do mundo, mas o começo de um novo, admirável mundo novo, literalmente aos pés, onde findam as compridas e belas pernas da vereadora socialista.
(Boa demais a foto de Rodrigo Senna que vi no blog de Anna Ruth: o ângulo baixo do retratista colhendo o momento em que Miss Arruda comparece diante da mesa das demais autoridades – naquele instante todas as autoridades eram de mais, já que todos os olhos tinham um só foco – enfim, e estende os longos braços para com as mãos segurar o vestidinho – não era uma minissaia – de encontro ao... ao... ao... enfim, de encontro. Uma maravilha!)
Bom. Agora vou ter que falar sobre a segunda parte do título da coluna de hoje, segunda-feira etc.
É.
Pois é.
Como eu ia dizendo.
Bom: a Sargento-Regina-também-causou-comoção-ao-vestir-um-pretinho-básico.
Pronto, já disse.
Palmas pra ela.
Mas os fiu-fiu vão todos pra Julinha Arruda.
*
RÉVOLUTIONNAIRE
A historinha do vestido curto sobre as pernas compridas, acompanhadas pelos olhos idem dos varões, me lembrou que comprei há alguns meses um livro que ainda não me dei ao tempo de ler: “Rainha da moda”, de Caroline Weber, Jorge Zahar Editor, 2008. O subtítulo é emblemático: “Como Maria Antonieta se vestiu para a Revolução” – francesa, claro.
DRESSED TO KILL
Moda, aliás, sempre foi um troço revolucionário: basta ver a imagem do jornalista Al-Zaidi atirando um sapato no George Bush Jr. Ou o vestido de Marilyn tornado curto por uma lufada de vento em “O pecado mora ao lado”.
CONEXÃO
Ainda nas extensas programações do Natal em Natal, o Coral Petrobras de Natal se apresenta, hoje, em Felipe Camarão. A partir da hora da Ave Maria. Na programação, uns clássicos em latim: “Gloria Excelsis Deo” e “Domine, Fili Unigenite”.
Na seqüência, o Auto do Boi de Reis de Manoel Marinheiro.
FAUSTO
Uma hora mais tarde (pois, 19h), programa bem menos angelical: exibição das gravações que a TVU fez da adaptação teatral-performática do mito do Fausto, sob o comando do professor-doutor Marcos Bulhões. No Nalva Café, Ribeyra velha de guerras.
Após a exibição do vídeo, segue-se debate.
CRESCIMENTO
No mesmo horário das sete da noite, tem Pastoril de Pirangi, no anfiteatro do Campus Universitário, novo local para o Natal da Afundação Zé Augusto – segundo o release porque “a Festa cresceu”.
Isso mesmo: a Festa com fê-é-fé maiúsculo.
Bom. Deve ser a única coisa que cresceu no âmbito (âmbito é ótimo) da Cultura de Todos.
NASCIMENTO
Voltando para “a Festa”, na seqüência do Pastoril tem mais um auto de Natal, “A Festa do Menino Deus”.
O texto é de Racine Santos, a música de Danilo Guanais, a coreografia de Wanie Rose, a direção de imagens de Wilberto Amaral, enquanto João Marcelino coordena e dirige tudo.
GENÉTICA
Nascido e festejado o Menino Deus, Antônio Nóbrega assume o comando da festa – sorry, Festa –, lá pelas nove.
Ontem, show e artista tinham mais a ver com o evento: o rapper MV Bill, que nasceu na carioca Cidade de Deus.



PROSA
“Como futura rainha, e mais tarde a rainha reinante, um rígido protocolo governava muito do que ela vestia, como vestia, quando vestia e até quem a vestia.”
Caroline Weber
Rainha da moda
VERSO
“efêmero é o amor sem corpo.”
Napoleão de Paiva
“amor veneris”
* por questões de espaço a página de cultura não foi publicada hoje na edição em papel - a crônica será publicada amanhã, alterando apenas as notas.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Cyntia Menezes

Cyntia Maria dos Santos Menezes é uma das boas surpresas que uma coluna diária ainda proporciona – muito além do baixo salário, do esforço constante, da pedra que cada Sísifo deve transportar, montanha abaixo, montanha acima (condições comuns a inúmeras categorias profissionais, incluindo professores, jornalistas e empregadas domésticas, pra citar algumas).
A professora Cyntia Menezes é uma daquelas leitoras que, apenas com a sua percepção, conseguem melhorar o que aqui se publica – e seu email é uma daquelas muitas coisas que mastercard, visa, americanexpress e que tais nenhuns podem se arvorar de comprar. Ainda mais necessário quando “o STF manteve o valor de R$ 950, mas, ao modificar os critérios para se calcular este valor, mudou totalmente o conceito de Piso” – como explica o deputado Mineiro em seu sítio na net (pra entender melhor confiram em www.mineiropt.com.br).
É por isso mesmo que segue abaixo, café-da-manhã vitaminado de esperanças, também estas muito além das árvores enfeitadas desta época do ano.

COMPROMISSO QUE DINHEIRO NENHUM PODE COMPRAR
Olá, meu caro Ivo! Com dez mil coisas para fazer e sem tempo ao menos para piscar, cá estou em frente ao computador para “escrevinhar-lhe” duas dúzias de palavras. Teria feito ontem mesmo se o dia tivesse durado pelo menos trinta horas. Como não foi possível fazê-lo cabe aqui aquele velho dito popular: “antes tarde do que nunca”. Seu artigo de quarta-feira passada, 17 de dezembro, me tocou bastante. Primeiro pelo fato de saber, enquanto educadora, que temos alguém como você como porta-voz (se é que me permite dar-lhe essa designação), que percebe o grande dilema que essa maravilhosa profissão – para mim um modo de vida – enfrenta nesse país.
A segunda razão que me motivou escrever-lhe tem haver com um questionamento que você levantou em seu artigo, que era mais ou menos assim: “será que você, leitor, confiaria a educação de seu filho a alguém que ganha menos de mil reais?” Não foi mais ou menos isso?
Hoje, devido à minha especialização em Educação Especial e Inclusiva, ganho pouco mais de mil reais – com os descontos mensais o valor diminui naturalmente para menos do que isso. Vergonhoso? Com certeza! Se merecia ganhar mais? Absolutamente! Se gostaria de ganhar mais? Definitivamente que sim! Porém meu compromisso com a educação independe de quanto ganho.
Você, e qualquer outra pessoa, pode sim confiar a educação de seu filho à profissional que sou, uma vez que atuo na rede pública tal qual atuava na rede privada, e talvez até com mais afinco ao perceber a extrema carência de estímulos que as crianças da região onde trabalho possuem.
O que quero poder dizer-lhe, e espero que entenda, é um dos pontos que mais tenho discutido com meus colegas de profissão. O descaso de muitos educadores que atuam na rede pública de ensino tem como escusa principal o baixo salário, porém, nada me garante que um aumento, por mais significativo que seja, traga consigo o compromisso que estes devem ter com a sua profissão. Não me garante que estes usarão uma parcela mínima de seu salário para comprar livros a fim de manterem-se continuamente a par de assuntos relacionados com a educação.
Pedindo licença à rede de cartões Mastercard, eu lhe digo que “existem coisas que não têm preço” – pra todas as outras existe... você já sabe o quê. Não me entenda mal. Este e-mail não é um modo de rebater o que você escreveu: é simplesmente para poder dizer-lhe que não tenho certeza se as linhas redigidas em seus artigos devem ser gastas por quem não tem merecido defesa. As maiores vítimas nessa história sórdida têm sido as crianças, que chegam ao quinto ano de escolaridade sem saber ao menos ler palavras formadas por sílabas simples. E tudo isso porque os educadores sentem-se revoltados por ganharem menos do que merecem.
Não! Não posso aceitar esse modo de pensar. Passar a juventude aos pés do senhor José de Alencar me fez ter uma visão um tanto romântica desta vida. Porém é preciso entender “romântica” nesse caso como sinônimo de quem acredita que as situações adversas podem mudar quando nos empenhamos individualmente para que isso aconteça. Tomei para mim as palavras que você redigiu e por estas, quero dizer-lhe muito obrigada! [Cyntia Menezes]



PROSA
“Como é possível que, sendo as criancinhas tão inteligentes, a maioria das pessoas sejam tão tolas? A educação deve ter algo a ver com isso!”
Alexandre Dumas Filho
O espírito de Alexandre...
VERSO
“No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse não ensinaria nada”
João Cabral de Melo Neto
“A educação pela pedra”

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Tocam os sinos da sexta-feira natalina

GILBERTO
Enquanto Elba Ramalho e Raimundo Fagner não chegam – pela trilionésima vez – Gilberto Gil se apresenta hoje dentro da programação natalina da Prefeitura Municipal, em seus estertores administrativos. Às oito da noite, Largo do Machadão, grátis.
(Espera-se: há rumores de que existem 40 milhões de motivos para o show ser cancelado.)
GIL
Enquanto isso assessoria do baiano informa iniciativa do ex-ministro da Cultura deste País Gigante por Natureza, durante sua turnê: “O público dos shows será estimulado a fazer registros e gravações com câmeras digitais e celulares. O tradicional ‘é proibido fotografar e filmar este show sem prévia autorização’ dá lugar a um caloroso mandamento: ‘grave e filme o que quiser e o que conseguir’”.
O nome do show? “Banda Larga Cordel” – a interação com o público já pode ser conferida no sítio www.bandalargacordel.com.br.
BALLET, BALÉ
Antes, rolam sapatilhas no palco do Largo do Machadão: hoje tem “Coppelia”, espetáculo de dança clássica, e “Fuxico”, dança contemporânea. O primeiro pelos alunos da Escola Municipal de Ballet Professor Roosevelt Pimenta, o segundo pela Domínio Companhia de Dança. O primeiro às 19h, o segundo às 19h20.
AGONIA
Enviado pela Assessoria de Comunicação da Fundação Zé Augusto: “Devido à indisponibilidade de passagens áreas, o show de Oswaldo Montenegro foi cancelado. A produção do evento informa que o restante da programação será mantida, incluindo o show do dia 20 de dezembro (sábado), porém com outra atração cultural. O artista que substituirá Oswaldo Montenegro ainda não foi definido. Assim que um novo contrato for firmado, comunicaremos a todos.”
Mas será possível que a Afundação Zé Augusto não dá uma dentro?
CONSERTO
Bom, não sejamos tão radicais: hoje, 19h, anfiteatro do campus da Ufrn, a Fundação Zé Augusto – braço (des)armado do Governo de Todos no setor (hic) cultural – promove o “Concerto de Todos”.
Quem são todos? Pois, a Orquestra Sinfônica deste Ryo Grande mais o sanfoneiro Dominguinhos, e, claro, todos nós filhos de Poty.
Na lista de músicas, o hit “Isso aqui tá bom demais”.
É aquela musiquinha animada que diz: “Olha, isso aqui tá muito bom/ Isso aqui tá bom demais/ Olha, quem tá fora quer entrar/ Mas quem tá dentro não sai”.
Ué!?!
DISPUTA
Arcesio Dantas, Júnior de Paula, Kelly Lira, Magnus Araújo, Marcílio Brapo, Toninho BJ, Zelito Coringa, mais as duplas Allan Jonnys-Francisco Nolasco, Camilo Henrique-Carmem Simone, Eduardo Bem-Tertuliano Ayres, João Salinas-Sérgio Farias e Paulo Neto-João Ferreira, são alguns dos compositores finalistas do 1° Festival da Canção e da Cultura Potiguar, promovido pela Assembléia Legislativa deste Ryo Grande.
Se houvesse concurso para melhor título, dificilmente alguém superaria o da dupla Salinas-Farias: “Todos vão se dar com o urubu”.
Disputando as atenções com Gilberto Gil (Machadão) e Dominguinhos (Ufrn), shows com a deusa Marina Elali, Pedrinho Mendes e Fernando Luiz.
Hoje, na Praça Iapissara Aguiar, Conjunto Santa Catarina, Zona Norte, a partir das 18 h.
VIDA ETERNA
Os descendentes de Mãe Fausta vão na contramão das tradicionais honras fúnebres e invés de celebrarem missa de sétimo dia comemoram o 109º ano do seu nascimento. Hoje, 17h30, na Matriz de Nossa Aparecida, em Neópolis.
NATAL DEBAIXO D’ÁGUA
Será que o politicamente correto ainda admite chamar o Papai Noel de “Bom Velhinho”? Pois, hoje, velhinhos e velhinhas desta Capital podem levar um amigo pra piscina da unidade I da FAL, na Candelária, às sete da matina, para um aulão de hidroginástica: é o projeto “Leve um amigo”, promovido pela Faculdade Aberta da Terceira Idade.
BIBLIOTECA D’ÁGUA
Já em funcionamento a Biblioteca Engenheiro Josemá de Azevedo, na Arsban (Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico), Rua Doutor Poty Nóbrega, 344, Lagoa Nova.
São quase 400 títulos, entre livros, informativos e revistas sobre saneamento básico, meio ambiente, recursos hídricos, educação ambiental, administração pública e comunicação – tudo disponível para consulta desta mui distinta população.
EXPOSIÇÃO
Com o saboroso tema “Frutas da região”, continuam abertas as inscrições para o concurso de fotografia promovido pelo Shopping Cidade Jardim – as seis fotos selecionadas pelo júri vão ser expostas em tamanho gigante na fachada da Roberto Freire. Até o 27 de dezembro, com premiação programada para o dia 7 de janeiro.
MODA
Nome melhor não poderia ter o réveillon organizado pela dupla Erika Nesi-Luciana Toscano: “da moda”. Vai ser em Pirangi do Sul, encontro do rio com o mar, ao som da Sonzeira Band, D’Vibe e DJ Lobo Mau. Além da praia, visual etc, uma “galera bonita” está na lista de promessas para o Ano Novo. Vendas na Bagatelle e n’A Graciosa.
HAPPY
O sobrescrito agradece, de coração, os votos de Feliz Natal e Próspero Ano Novo – e suas devidas variações mais criativas – e retribui em igual intensidade. Como diz Flávio Rezende, “seja feliz”.



PROSA
“Não há nada mais esdrúxulo sobre a Terra do que o Poeta. Só o ornitorrinco.”
Hilda Hilst
Cascos & carícias &...
VERSO
“Descasco o dementado cotidiano
E seu rito pastoso de parábolas.”
Hilda Hilst
“Alcoólicas”

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Um demiurgo na Funcart

Que eu saiba, ninguém apostou um vintém no artista e marchand César Revôredo. Para a Funcart, Capitania das Artes. Pois, fonte das mais confiáveis me diz que é o nome, que já fechou inclusive com Dona Micarla de Sousa.
Quem é César Revorêdo?
A pergunta não é de todo desprovida de senso: Revorêdo já foi, digamos, mais arroz-de-festa no cenário artístico nativo. Quadros seus, inclusive, teriam aparecido nas novelas da Globo, das sete ou das oito, não sei se vem ao caso. Mas, enfim, o rapaz – que também é jornalista, daqueles formados – era um nome bem mais presente no burburinho que eram as artes potyguares dos anos oitenta e da ressaca que seguiu-se a aqueles anos.
Era também dos mais onipresentes quando o boom decorativo da Capital Espacial do Brazil começou a sua efervescência, misturando num mesmo caldinho arte, arquitetura e paisagismo, tudo muito incline ao “nouveau richism” do Arraial de Palumbo. César tinha programa de TV, encarte em jornal etc.
Depois – me parece – se aquietou. Mais concentrado e dedicado à sua galeria de arte e aos artistas que representa. São 13, incluindo ele mesmo. O que prova que supersticioso o moço não é. Ou é, mas às avessas. Aliás, sua galeria de arte não se chama, pois, “galeria de arte”, mas – atentem – “Gabinete de Arte”. E isso faz toda a diferença.
César é, pra dizer o mínimo, diferente.
Há pouco tempo ainda se encontrava quadros de César pelos sebos do centro histórico de Natal num estilo anos-luz distante dos atuais: um estilo arrastando asa pro naïf, um toque de ingenuidade. Se o cidadão visitar seu Gabinete e depois ler o verbete a ele dedicado no dicionário que é o livro de Dorian Gray Caldas, “Artes plásticas do Rio Grande do Norte, 1920-1989” (Ufrn, Funpec, Sesc, 1989), vai tomar um susto: lá diz que “sua temática se encaminha para os registros humanos, o casario, os sobradões coloniais, as visões dos engenhos e dos pátios das casas-grandes da infância”.
Já o crítico de arte Marcus de Lontra Costa – no sítio do próprio Gabinete – começa por explicar que, “em César Revorêdo a forma é resultado do método. Fiel ao ideário modernista, o artista investe numa espécie de valorização do processo construtivo. Diante da matéria bruta, inerte, o artista atua como Demiurgo, operando uma série de ações com o intuito de construir um objeto real, um corpo artístico formado pela clareza e pela valorização da inteligência”. Lá pra diante explica o conceito do artista: “criar a verdade através da harmonia e da justa integração da arte com o espaço que a circunda. Essa é a poética, a sua inquietante arquitetura, a sua alquimia”.
Bom, como crítica-elogio-artístico tá uma beleza. Se também se adaptar à administração da Funcart, também não tá mal.
Noves fora o blá-blá, me parece nome bem próximo à estética make-up da Borboleta e à sua visão empresarial de administrar o município.
*
NOMES
César não foi o primeiro a ser convidado: a também jornalista Sylvia Serejo era o nome preferencial da neo-prefeita-eleita, mas, declinou, por motivos pessoais e profissionais – está grávida e o trabalho na Verbo precisa do olho da dona.
MARATONA
Hoje, na Funarte (Rio – RJ), Lia de Itamaracá se apresenta – junto a três potiguares: Pedro Paulo, no violão, Rafael Almeida, no cavaquinho, e Carlinhos Zens, flauta – Zens, aliás, foi também o diretor musical de “Ciranda de ritmos”, último CD da moça de Itamaracá.
DESPOCKADO
Do leitor que assina simplesmente “Tito”, recebo email declarando “lamentável” evento recentemente promovido pelo Banco do Brasil nesta Capital:
“A divulgação em periódicos do show da Spock Orquestra de Frevo acendeu expectativa naqueles que apreciam a cena cultural local. Infelizmente nem tudo foi como deveria ser. A começar pelo local escolhido: Hotel Sehrs, que dispunha de uma sala de espetáculo improvisada, sem ar condicionado. O calor foi infernal. Difícil acompanhar o show sem certo desconforto. Diga-se de passagem que os caras da orquestra eram excepcionais. A qualidade técnica e musical dos componentes desta ‘frevo big band’ superam em muito alguns dos instrumentistas de jazz americano. Em compensação, o descaso dos organizadores (Banco do Brasil) em proporcionar um ambiente agradável e saudável foi do lamentável ao nível mais tosco visto. O show, anunciado em alguns jornais, era evento fechado. O público, desavisado da obrigatoriedade de convites, teve que esperar a boa vontade dos organizadores para liberar entrada, o que só aconteceu após todos os ‘convidados’ terem adentrado o recinto. O fato merece maior esclarecimento sob pena de ensejar denúncia aos órgãos competentes. Dinheiro público para financiar show em evento fechado e com anúncio pago em jornal , dando a impressão de que era aberto ao público denota má-fé. O povo merecia ter acesso e direito de assistir esta orquestra em local público.”



PROSA
“Por exemplo, sou o tipo de homem que acha que um marido tem de fazer sexo com suas esposas toda noite.”
Martin Amis
Granta 3
VERSO
“O pseudopoeta acena para o poeta medíocre,
o poeta medíocre para o verdadeiro poeta.”
Enzensberger
“O naufrágio do Titanic”

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Sonhos que o dinheiro pode comprar

Ainda ontem o sobrescrito tascava neste mesmo espaço o título: “Sonhos que o dinheiro não pode comprar”.
Hoje retiro o “não”.
Não é crônica reciclada, adaptação, arremedo de ontem – pela preguiça natural que este dezembro de calor e compras de Natal provoca.
É que, hoje, o Supremo Tribunal Federal – em Brasília, claro – decide pela suspensão ou não da lei que garante um piso salarial de R$ 950 para os professores de escolas públicas deste Brazil Varonil.
Diga aí, caro leitor, minha mui estimada leitora: você confiaria a educação do seu filho a alguém que ganhasse menos de mil reais ao mês?
Não que o grau de confiabilidade de alguém possa ser mensurado pelo tamanho do contracheque ou da receita mensal. Mas, convenhamos, como exigir de alguém, de um professor, mestre, educador, competência em seu labor se não nos dignamos – a tal sociedade organizada – a prover-lhes uma paga igualmente digna?
É a mesma situação dos policiais, outro exemplo. Enquanto o cidadão que detém um certo poder para mudar o rumo das coisas sente-se minimamente seguro no seu dia-a-dia, o resto que se vire – no coletivo-transporte-de-todos, na rua de terra batida e pouca ou nenhuma iluminação, no barzinho da periferia.
Há tempos que a tal elite branca vem dando seus pulos – plano de saúde, escola particular, condomínio fechado com guarita eletrônica e cerca elétrica e porteiro uniformizado – enquanto a plebe, há mais tempo ainda, se vira nos trinta – nos trinta dias. Cada qual com a paga média de dois dólares.
Estranhou os dólares? É a base de cálculo do Banco Mundial para medir a pobreza: “moderada” para aqueles que recebem menos de dois ao dia, “extrema” para quem vive com menos de um dólar por dia. Já o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o famoso IBGE, considera pobre todo brasileiro com um rendimento individual de até R$ 121 por mês.
Assim sendo, um professor de escola pública pode – hoje, dependendo do STF – ser considerado 7,8 vezes mais rico que um pobre moderado. Ou “extremo”, sei lá eu.
Muito pouco ainda. Afinal, o que compra um professor com um salário de menos de mil reais ao mês? Descontando a despesa com habitação, energia, telefonia, alimentação, transporte, sobra muito pouco, ou não sobra, para investimentos que incrementem a própria educação e conhecimento. Um professor interessado em comprar livros, por exemplo, fica impossibilitado de fazê-lo. Eu disse livros? Ler um jornal diário custa em média 30 reais/mês. E, pois, que despautério, desejar que professores desejem livros comprar!
Se é difícil investir nos próprios sonhos, que dirá investir no sonho dos filhos “dos outros”?
Aí quando a polícia não consegue prender os bandidos que por sua vez não freqüentaram a escola, por que pública e com as deficiências de praxe, é um deus-nos-acuda.
Pior: quando a polícia, despreparada e mal paga, por desventura erra, e uma bala perdida atinge o cidadão da Ilha da Fantasia, seus habitantes gritam. Reclamam. Clamam por justiça.
Com os professores não deveria ser diferente. Mesmo não sendo os mesmos mestres de nossos filhos. Mas dos filhos dos “outros”, aqueles, além dos cordões dos blocos do Carnatal (um piso salarial igual a 3,8 abadás).
*
MESTRES & MUROS
Câmara Cascudo dizia sobre dois de seus professores, Pedro Alexandrino dos Anjos e Francisco Ivo Cavalcanti, que tinham trabalhado “no cimento e gesso do meu espírito”.
Enquanto Nei Leandro de Castro, em “Memória quase afetiva”, enxergava assim a escola do seu tempo: “O Colégio Marista/ tinha muros altos, medievais,/ que era para nenhum pobre/ cruzar os seus umbrais.”
DIANA
O Projeto Poticanto – que tem como mote o dístico “Um canto 100% potiguar” – fecha a temporada 2008, com um show de Diana Cravo. Hoje, oito da noite no TCP (Teatro de Cultura Popular Chico Daniel) da Fundação Zé Augusto.
De grátis.
BRUMAS
“As religiões matriarcais, onde as mulheres eram percebidas em sua totalidade, e o sacro e o profano caminhavam lado a lado, pois o sexo também era percebido como ato divino, encontram-se ‘submersas em brumas.’” – do release da Companhia Xamã de Teatro, sobre “Las nieblas”, que será exibido hoje, 21h, no Budda Pub, Black Point.
Ana Harff, Cibelle Souza, Ellen Paes, Iara Marzocchi, Isabel Cristine, Márcia Pereira, Paula Braz, Regina Silva, Vívian Szterling e Tatiana Minchoni prometem dissipar as tais brumas.
PELO BRASIL
É amanhã que o nosso Carlos Zens dá início a um belo périplo musical ao lado da lenda-viva Lia de Itamaracá: na Funarte, antigo estado da Guanabara. Na sexta-feira, o grupo volta ao Recife, onde faz show no Parque São Pedro. O sábado será dedicado à gravação do programa “Som na Rua” (TV Brasil). Domingo, em vez de descansar, a turma se apresenta no Sítio da Trindade.



PROSA
“A dor é sua educação e sua fé. A dor o torna crente.”
Alan Pauls
História do pranto
VERSO
“Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.”
Murilo Mendes
“Canção do exílio”

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Sonhos que o dinheiro não pode comprar

Uma coisa puxa a outra e domingo desses dou de cara com Rock Hudson e Lauren Bacall num filme mediano, “Written on the wind” (no Brasil, “Palavras ao vento”). Safra 1956.
Hudson é Mitch, Lauren é Lucy. Entre os dois rola uma atração. Tudo bem, se Lucy não estivesse naquela condição que o Rei Roberto Carlos resumiria numa questão quase insolúvel e dramática: “Pois comigo aconteceu/ eu gostar da namorada de um amigo meu”.
A terceira perna do triângulo era Kyle, interpretado por Robert Stack. Um playboyzinho herdeiro de um magnata do petróleo, um sujeito triste. Triste e amargo. E alcoólatra. Uma bela combinação que, adicionada a uma mulher com o rosto de Lauren Bacall, claro que só pode dar em merda – com o perdão da palavra, mas outra não há para melhor definir o entrevero.
Mesmo não acontecendo nada entre o melhor amigo e a esposa, o maridão sente-se enganado etc. Quando ela lhe diz que está grávida ele nem mesmo espera pela dúvida eterna, já descrita por Machado através de Bentinho e Capitu e Escobar.
Kyle aplica uns safanões em Lucy, o bastante para lhe provocar um aborto. Mitch toma suas dores, uma discussão, uma arma de fogo, um acidente, e Kyle morre. Entre idas e vinda, o final é feliz. Ao menos na versão cinematográfica.
Descobri que a história teve inspiração na realidade. E envolve uma mulher com uma dessas vidas mais que dramáticas. Libby Holman era uma atriz da Broadway sem meias-tintas, meias-caras, meias-bocas: além de homens, teve muitas amantes mulheres, entre elas a herdeira da DuPont, Louisa d’Andelot Carpenter. Em 1931, aos 27 anos, casa-se com um herdeiro, não de poços de petróleo, mas de folhas de tabaco – Smith Reynolds, da R. J. Reynolds (Camel, Kool, Winston, Salem, Pall Mall). Uns sete anos mais novo, o que, na época, era já um escândalo em si.
Smith não tava nem aí pros negócios da família – e não queria que a esposa voltasse aos palcos. Passam um ano na casa da família Reynolds, escandalizando a todos com suas festas e amizades. Até que um tiro mal explicado lhe tolhe a vida. Libby Holman foi indiciada, junto com o suposto amante, por assassinato. A família Reynolds consegue abafar o caso e muda a causa da morte para suicídio.
Ao contrário do filme, Libby Holman tem o filho, que morre antes de completar 20 anos, escalando uma montanha. Adota outros dois, casa-se outras duas vezes, o segundo marido se suicida, vive anos junto com Louisa d’Andelot, e nos anos 40 tem uma relação com a escritora Jane Auer Bowles, que era esposa do também escritor Paul Bowles (confira uma visão caricata da relação dos Bowles em “O céu que nos protege”, de Bertolucci).
Em 1971, Libby fecha a garagem de sua mansão, liga o motor do seu Rolls-Royce e se deixa morrer.
O motor de um Rolls-Royce, dizem, é o som mecânico que mais se aproxima do silêncio.
*
SURREALISMO
“Dreams that money can buy” é o único filme onde Libby atua. Dirigido por Hans Richter, em 1947, é um filme experimental sobre um sujeito que ganha a vida contando, em troca de dinheiro, seus sonhos. Os cenários, criados num loft de Manhattan, ficaram por conta de nomes como Man Ray, Max Ernst e Marcel Duchamp.
O VIAJANTE
Paul Bowles (1910-1999) é um dos escritores preferidos do sobrescrito. Viveu cerca de meio século em Tânger, no Marrocos, tema de muitos dos seus contos (traduções brasileiras de sua obra são, infelizmente, difíceis de achar), e onde recebeu amigos-escritores como Tennessee Williams, Truman Capote, Gore Vidal, e os beats William Burroughs, Allen Ginsberg e Gregory Corso.
Com Tennessee Williams escreveu alguns diálogos para “Senso”, filme de Luchino Visconti, e, compositor prolífico, também escreveu a música de “Dreams that money can buy”.
AVE MARIZE
“Não aceito alguns movimentos retrógrados e reacionários que transformaram essa figura forte na mulher passivamente submissa de uma religiosidade alienante ou na tola doce mãezinha dos céus” – Marize Castro, autora do texto do Auto de Natal deste ano, sobre Maria, mãe de Jesus.
No lado feminino do espetáculo tem ainda as cantoras e compositoras Simona Talma e Valéria Oliveira, a figurinista Kátia Dantas, a fotógrafa Candinha Bezerra, e Ivonete Albano como assistente de produção.
REMEXO
Ainda não foi ontem que saiu o novo nome para a Funcart.
Com apenas sete secretários e uma secretária, Madagascar continua.
REMEXO II
É hoje que acontece mais uma eliminatória do 1º Festival da Canção e da Cultura Potiguar, realizado pela Assembléia Legislativa deste Ryo Grande – a última, antes da final, dia 19.
A partir das 18h, na Ilha de Santana, Caicó City.



PROSA
“Tudo, como se sabe, acontece inicialmente em outros países e só depois no nosso.”
Jorge Luis Borges
O informe de Brodie
VERSO
“Roubem o que lhes roubaram,
tomem finalmente o que lhes pertence”
Enzensberger
“O naufrágio do Titanic”

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

“Eu me remexo muito...”

Bom, bom, bom: se o leitor e a leitora forem pais de garotinhos e/ou garotinhas à altura da cintura, devem estar carecas de saber que o título da coluna de hoje é o refrão de “Madagascar”, repetido a exaustão em “Madagascar 2”, em cartaz num cinemão perto de vocês.
Música tão bombástica que é capaz de levantar defuntos, fazer aleijado soltar as muletas, paraplégicos rodopiarem sobre uma única das duas rodas da cadeira, pois, de rodas.
Sim, sim, sim: e por que cargas d’água amanheço, despertando o terror inato de uma segunda-feira suarenta, em pleno verão, mas não ainda veraneio, com o hit pegajoso da estação?
Ora, píulas! Porque é hoje que Dona Micarla de Sousa Weber vai anunciar a sua tropa de elite, crianças! O secretariado da borboleta dourada. Casa de criação, viveiro, borboletário.
O negócio não tá muito fácil, não, pelo que leio nos blogs da vida. Dona Thaisa Galvão, dia 11 do 12, 14h25: “Ninguém que ser secretário de Saúde de Natal”. Dona Thaisa até contou nos dedos de uma única mão a quantidade de recusas ao convite: cinco! Teve convidado que recusou duas vezes – não sei qual mais teimoso, se ele, ou se a neo-prefeita-eleita, insistindo, insistente.
Dona Laurita Arruda Câmara Patriota, dia 10 do 12, 10h45: “Só faltam os gatos para completar secretariado” – gatos? Calma, calma, me explico, aliás, Dona Laurita Arruda Câmara Patriota explica: “aqui em Natal, um dos critérios para ser secretário municipal é a pouca idade. Pode parecer piada, mas é assunto corrente entre os conselheiros da futura prefeita Micarla de Sousa. Agora só resta aguardar o surgimento dos gatos secretariáveis.”
Bom, se o critério, além da idade, for o de beleza, sei não.
Deve ser por isso que – Dona Ana Ruth, 11 do 12, 08h54 – “o presidente nacional do PV, Luiz Penna, disse que o objetivo da legenda é fazer da administração de Micarla de Sousa em Natal uma ‘vitrine para o Brasil e para o mundo’”. Cito ainda Don’Ana citando textualmente a fala do verde pra não ficar dúvida: “Nós temos o compromisso de fazer da administração de Micarla uma vitrine para o Brasil e para mundo.”
Bom, se o enfeite é para o Brasil, um Fábio Assunção tá de bom tamanho (vá lá, um Fábio Faria quebra o galho), mas se o lance é internacional, nenhum mancebo abaixo da linha de beauty de um Brad Pitt, faz favor!
Pra finalizar, mais uma dona, a Dona Hilneth Correia (11 do 12, sem horário definido): “Dentro do novo modelo de gestão a ser apresentado pela Prefeita eleita Micarla de Souza pode haver fusão da Funcarte com Secretaria de Turismo. Aí sim, vou crer que turismo e cultura caminharão juntos.”
Minha nossa! Em sendo verdade, agora sim que a cultura não vai pra canto algum – ficará só vendo o rastro dos aviões de carreira levando secretários e agregados pras feiras de turismo.
Mas, vamos ao que interessa: a essa altura do campeonato tem muito neguinho entoando o melô de “Madagascar”, e se remexendo esquizofrenicamente pra saber quais dos muitos convidados serão alguns dos poucos escolhidos.
Então, todos juntos: “Eu me remexo muito/ Eu me remexo muito/ Eu me remexo muito/ Remexo...muito!!// Eu me remexo muito/ Ele remexe muito/ Ela remexe muito/ Nós remexemos muito/ Eles remexem muito/ Você remexe muito”.
Madagascar é aqui.
*
TREVAS
A jornalista, bailarina, coreógrafa – “e por aí vai” – Ellen Paes anuncia o fechamento do ano para a próxima quarta, depois de amanhã: é o show, espetáculo, festa lounge – e por aí vai – “Las nieblas”, no Budda Pub, Ponta Negra, nove da noite.
Obra e graça da Companhia Xamã Tribal, que começou com uma reunião de bailarinas de dança do ventre e, hoje, dois anos después, vai “do ancestral ao contemporâneo, do sagrado ao profano, da sedução à hostilidade, da delicadeza à agressividade” – ou seja: as moças se remexem muito.
O neo-secretariado da neo-prefeita-eleita bem que poderia aparecer.
ARMÁRIO
Acredite se quiser, mas na última segunda-feira a Rai – TV estatal italiana – exibiu “O segredo de Brokeback Mountain” sem as cenas de sexo entre os dois caubóis americanos, no filme de Ang Lee, inspirado em conto de Anne Proulx.
Diante dos protestos dos gays italianos, a TV voltou atrás e vai exibir “O segredo...” sem censura.
ESPERANÇA
Enquanto isso, me cai em mãos uma Folha de Sampa, datada 30 de novembro, página C4 – diz o lead: “A militância gay do Paraná anda louca da vida. Uma empresa colocou à venda uma cachaça com o rótulo ‘Cura Veado’, em que se vê um homem desmunhecado, de batom, unhas vermelhas, sobrancelhas arqueadas, cílios postiços e com os cabelos tingidos de rosa.”
Será que é propaganda enganosa?
35
Começa hoje e vai até o próximo sábado o curso de assistente de câmera 35 mm (película). Horário ingrato, das 9h às 17h30 – no sentido que o cidadão deve estar de férias ou se ausentar do trabalho – mas com a competência da professora Andréa Scansani.
Corram pra se inscrever, mas antes liguem: 3232.5304 ou 3232.9735.



PROSA
“Dança: Ir pulando ao som de uma música abafada, preferivelmente com os braços em volta da mulher ou filha do vizinho.”
Ambrose Bierce
Dicionário do diabo
VERSO
“Dance, dance, dance
Gaste um tempo comigo”
Rita Lee
“Dançar pra não dançar”

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Paulo Laguardia

[Cultura 131208 sábado]

Paulo Laguardia é mais famoso como o vencedor da 3ª edição local do DocTV – depois de Fabião das Queimadas, filmado por Buca Dantas, e do professor Hermógenes, dirigido por Marcelo Buainain, vencedores das edições anteriores, Laguardia encontrou na cineasta potyguar Jussara Queiroz o mote para o seu “O vôo silenciado do jucurutu”.
Agora, debruça-se sobre a vida de Djalma Maranhão, tarefa das não muito fáceis, numa terra fadada ao esquecimento em vida, imagine daqueles que já morreram, e, literalmente, no exílio.
Enquanto isso, o diretor vai ao cinema, de onde escreve suas impressões sobre mais um filme cult (que, felizmente, ainda não saiu de cartaz).
UM MUNDO MELHOR
Exibido no Cinemark, na sessão dita “cult”, ou seja, no horário único das 15h – infelizmente, pois limita o acesso daqueles que estudam ou trabalham nessa hora –, “Mandela, luta pela liberdade” é daqueles filmes que deixam na gente algumas sensações fortes e a vontade de sair do cinema com ele debaixo do braço, levando-o pra casa para revê-lo quantas vezes quisermos.
A história por si só já dá um grande filme – há quem diga que seria difícil alguém fazer um filme ruim com uma história tão boa – mas, reconheçamos, incompetência não tem limites. E Bille August, o diretor, foi longe: além de se manter fiel à história, dando ares de documentário à sua ficção, cercou-se de ótimos atores, a maioria desconhecidos, e conseguiu fazer de um enredo duro da história da humanidade, uma história bonita, emocionante, mostrando, como fundo, a belíssima paisagem da África do Sul, que não fica nem um pouquinho atrás do belo cenário potiguar.
Mas é ao mostrar com tons realíssimos a trajetória desse homem brilhante – que tanto tem de fidelidade à sua causa (a luta pela liberdade do povo negro, oprimido pela minoria branca), como também dotado de inteligência superior e convicção em seus princípios e sonhos – que August nos faz crer um pouco mais na humanidade, e que, sim, é possível termos esperanças de um mundo melhor.
“Mandela, luta pela liberdade” é um filme praticamente de mocinhos e bandidos, mas que traz outro personagem de muita importância (e, pelo menos pra mim, até então desconhecido nessa história toda): o carcereiro de Nelson Mandela, que sofre, durante o processo, uma transformação de dar arrepios.
Pena que não tive conhecimento de qualquer político de nossa taba nas sessões – pudera, eles deviam estar trabalhando, né? – mas, se estivessem, certamente refletiriam sobre o filme e teriam certeza de sua pequenez diante de tanta grandeza de um ser humano. Quem sabe, assim, eles melhorariam pelo menos um tiquinho.
Pois, Mandela, depois de 27 anos de prisão (e após ter recusado a oferta de liberdade oferecida várias vezes pelo presidente da África do Sul, afirmando “só terei liberdade quando meu povo também a tiver”) foi solto, candidatou-se, e, eleito presidente do país, unificou a nação, cumpriu o mandato, mas não quis a reeleição, ao contrário de muitos por aqui.
Acho que poucos conseguem olhar com orgulho para o passado. E não me lembro de qualquer homenagem que Nelson Mandela tenha recebido de nós brasileiros, principalmente os da dita raça negra, por quem ele tanto lutou (e ainda luta).
Quanto a mim, só estou esperando o filme ser lançado em DVD, para que possa lançar mão dele nos momentos de abatimento e tristeza proporcionados por nossa realidade. Ao revê-lo, me realimentarei para suportar esse legado que ainda carregaremos por muito tempo. [Paulo Laguardia]
*
GRÃO
Aprovada ant’ontem emenda do deputado Fernando Mineiro destinando R$ 500 mil para publicação de livros – “um grãozinho de areia”, na definição do deputado petista, mas suficiente, segundo ele, pra botar a Lei do Livro nas estantes deste Ryo Grande.
De lambuja, mais R$ 150 mil para a Lei do Patrimônio Vivo, que destina bolsas mensais de R$ 750, para pessoas, ou R$ 1,5 mil, para grupos.
CUZCUZ
Sai hoje à noite, quase madrugada, o resultado dos concursos “Chef Gastrônomico”, “Chef Amigo” e “Chef Acadêmico” (Festival do Camarão parte II). Entre os concorrentes, pratos de títulos quase literários: “Camarão ao molho de cajá e canela” (do chef Márcio Freire), “Camarão Reis Magos com salada cabocla e geléia de cana-de-açúcar” (Luciano Almeida), com “Torre de camarão ao estilo Reina Pepiada” (Thiago Maia), “Camarão em farofa de coco caramelado, molho goiaba, pétalas de cuscuz marroquino e aspargos” (Guga Bulhões), com “Camarão em crosta Bossa nova, com couscous marroquino ao pesto de coentro, com caviar de quiabo e outras bossas” (Emília Maux), e “Shrimp Missô com chutney de jerimum e crocantes de tapioca” (Gabriel Negreiros).
PALATO
Noite de shows musicais, além dos eno-gastronômicos – Tânia Soares, Diogo Guanabara e Rodolfo Amaral – além de palavras que vão além da mera boca-pra-fora: a chef Adriana Lucena palestra sobre “Preservação da Cultura Gastronômica” e o sommelier Rodrigo Lima explica como harmonizar vinhos.



PROSA
“Diante do herói incômodo só resta um recurso – fuzilá-lo e erguer-lhe um monumento.”
Millôr Fernandes
Millôr definitivo
VERSO
“e sobretudo
não me esqueças
por trás das grades”
Bosco Lopes
“Não me esqueças”

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A cabrocha, o luar, o violão e a sexta-feira

FRENOCÔMIO
Laélio Ferreira anuncia que a edição das “Obras completas” de Othoniel Menezes está quase nos finalmente – “cerca de 95%” – enquanto ele próprio está quase nos corredores do João Machado, “pirado todo”, pesquisando e escrevendo um mundaréu de notas de pé de página.
De lambuja, pesco um trecho de fragmento que o filho de Othoniel me envia: “Hércules acorrentado no socavão do forte dos Santos Reis, Briareu a biscatear com um dedo das cem manoplas, São Cristóvão bonacheirão, escrevendo prefácios para livros de cordel, os largos ombros cheios de macaquinhos e sagüis assombrados com a correnteza” – é o belo perfil 3x4 de Câmara Cascudo, segundo o autor de “Serenata do pescador”.
GENTE ESQUISITA
“O fato é que o sítio do Tácito, em vez de servir de cenário para bons papos, é utilizado como um ringue para brigas de artistas e escritores com o córtex cerebral mais desenvolvido que a média da população.” – Carlos Fialho, jovem escriba e neo-convertido à blogosfera (blogdofialho.wordpress.com), sobre o Substantivo Plural.
Aliás, o sítio de Tácito Costa ganhou o Rubens Lemos de Jornalismo Cultural, categoria Jornalismo Digital.
PULITZER
O que prova que esta Capital está sempre avant-garde: só agora, em sua próxima edição, o Prêmio Pulitzer de Jornalismo, tradição americana, vai aceitar candidatos blogueiros e congêneres.
Até então apenas sítios de publicações impressas eram aceitos.
Antes que os nativos da Jerimulândia se animem, apenas material originado e publicado nos EUA pode participar.
FELIZANOVO
Hoje rola a última “Sexta.Disco” de zero-oito, com, nas picapes – como se diz por aí –, o DJ Solon Silvestre. Na AABB, a partir das onze da noite, senhas a 15 reais.
HANGAR
Sérgio Groove e seu baixo venceram a acirrada disputa de Melhor Instrumentista do Prêmio Hangar zero-oito.
Já o júri popular foi de Khrystal (Melhor Show Realizado – “Coisa de preto”), Rosa de Pedra (Revelação Musical do RN) e Robertinha Sá (Destaque da Música do RN).
VENDE-SE
Leilton Lima anuncia a venda de uma casa em Emaús, com uma varanda plena de armadores, “para que tudo [...] possa ser acariciado com a alma,/ num suave vai-e-vem de rede./ Balanço de fazer sonhar,/ balanço de puxar namoro”.
VERDE-SE
Bom programa hoje para a neo-prefeita-eleita dar o ar de sua graça: “A questão ambiental, histórica e geográfica no Rio Grande do Norte, Nordeste e Amazônia” é o tema do debate organizado pelo Comitê Chico Mendes – afinal, nunca na história deste Ryo Grande, sua capital esteve nas mãos (ou asas) do Partido Verde.
A partir das 17h, no setor 2 de aulas da UFRN.
ASTROS & CELEBRIDADES
Falta menos de um mês para o Proastro – Programa Potiguar para a Popularização e Educação em Astronomia e Astronáutica – dar seu ponta-pé inicial em terras de Poty: a idéia é estimular a curiosidade da galera mais jovem em relação aos astros.
Não confundir astros com celebridades.
Astros são aqueles presentes nos versos de Orestes Barbosa: “Mas a lua furando nosso zinco/ Salpicava de estrelas nosso chão/ E tu pisavas nos astros distraída/ Sem saber que a ventura desta vida/ É a cabrocha, o luar e o violão”.
CARAVANA SIDERAL
O Proastro tem em José Renan de Medeiros seu maior divulgador, e na Fapern uma instiuição apoiadora – o ano vindouro será o “Ano Internacional da Astronomia”.
A idéia é visitar vários municípios do estado através da “Caravana da Astronomia”.
IDÉIA NA MÃO, 35 NA CABEÇA
Vlamir Cruz, que não perde uma oficina de vídeo que se realiza por estas playas (e têm sido muitas), dá o toque: o CANNE (Centro Técnico Audiovisual do Norte e Nordeste) dispõe de uma câmera cinematográfica 35 mm, de última geração, “para atender as produções independentes do Nordeste e possibilitar a capacitação de operadores e assistentes de fotografia”.
Além de uma ilha de edição e uma câmera HDTV, compradas – olha só – pela Fundação Joaquim Nabuco (a Zé Augusto de Pernambuco).
Se você é um cineasta independente e tem um projeto com objetivos educativos e culturais, o CANNE pode dispor gratuitamente os equipamentos: basta enviar proposta que se encontra no sítio da Fundaj (www.fundaj.gov.br).
PRESIDENTES
Enquanto isso nosso presidente da Fundação Zé Augusto lança livro hoje, logo mais, 19h, na livraria do Midway, com a participação dos Meirinhos do Forró, Sonorosinho, Coral Harmus, cordelista Antônio Francisco e dos poetas da Sociedade dos Poetas Vivos e Afins – com tanta gente “no palco” quem precisa de platéia?
Ah! O título do livro? “Lula na literatura de cordel”. A editora? A Queima-Buxa, de Mossoró City.
Tudo muito legal – menos usar a assessoria de imprensa da FZA pra divulgar a obra.



PROSA
“A loucura é o céu e o inferno – e o resto é limbo.”
Campos de Carvalho
Cartas de viagem...
VERSO
“O feminino atrai meu anjo e vive
A querer transformá-lo num diabo”
Shakespeare
“Soneto CXLIV”

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Quem ama o feio bonito lhe parece

Do leitor que assina Ivson Cavalcanti, a coluna recebe o email que segue, sem tirar nem pôr vírgulas, acentos ou reticências, maiúsculas ou minúsculas:
“Caro Mário Ivo,
Lendo a sua crônica do dia 05 de dezembro no JH Primeira Edição, ‘Especial Carnatal II’, senti sua falta de carinho aos frequentadores da praia de Pirangi, nos domingos. Cuidado! Mário, não esqueça que a praia de Pirangi ainda pode ser frequentada por pessoas de aparência feia, humilde, sem modos requintados, porque infelizmente, essas pessoas não podem participar do Carnatal, que é uma festa particular feita com nossos impostos. Sendo assim, eles – os feios – recorrem ao lazer gratuito. É necessário apenas orientação e fiscalização para que não sujem a praia. Já no Nordestão como você falou, tem gente bonita, elegante, fruto de uma elite branca que ainda domina, Coisa do capitalismo consumista. POis, lá no Nordestão, o desfile exibicionista de pessoas ricas(?), nos remete à um mundo deslumbrante que somente os cartões de créditos e cheques especiais sabem aonde vão parar.
grato, Iv son M. Cavalcanti”
Ora, mas que essa, seu Ivson! Depois ainda chamam o sobrescrito de petista... se eu sou petista, o senhor deve ser do PSOL! Basta reler a crônica para constatar que o meu critério foi eminentemente estético – e não vou nem falar de ironia, que presumo ser substantivo ausente do seu vocabulário.
Quanto mais, preconceituoso (acusação ao sobrescrito que se pode ler nas suas entrelinhas) é vossa inselença, que logo após o adjetivo “feia”, tasca um “humilde, sem modos requintados”. Eu nunca teci nenhum comentário à suposta classe social do “magote de gente feia” (texto meu), nem tampouco à sua (deles) educação ou falta de.
Como está bem enunciado no abre-alas da crônica, ela foi escrita há mais ou menos um ano – não existe menção ao Carnatal, senão no título, e à preguiça que me fez reciclar texto antigo.
Ademais, só o senhor mesmo para imaginar que Pirangi é terreiro inferior, nas aparências exibicionistas, ao supermercado Nordestão – mais próximo, segundo vosmicê, a um certo “mundo deslumbrante”.
Pirangi, sim, caro Ivson, é que é terreiro da elite branca – da qual não me excluo e a qual costumo criticar neste espaço.
Quanto à feiúra ou boniteza não existe nenhum vínculo com a conta bancária ou com o limite do cartão de crédito.
Agora, sugerir que as tais pessoas de “aparência feia, humilde, sem modos requintados” necessitam “apenas orientação e fiscalização para que não sujem a praia” (textos seus) aproxima o seu email daquele jargão bem casa-grande: “pobre, mas limpinha”.
*
FLORESTAAo completar 175 anos, a Matriz de Nísia Floresta realiza, dentro da programação da festa da padroeira, o IV Festival de Cultura Popular, de 11 a 14 de dezembro.
Segundo o release, tem passeio ciclístico, cortejo cultural, feiras e oficinas de artesanato (fibra de palha e casca de coco), teatro, dança, fotografia, desenho, comidas típicas e o infalível etc.
Como também a inevitável exposição sobre a vida e a obra de Nísia Floresta, escritora, poeta, tal.
BONEQUINHA DE LUXO
Também hoje estréia “Coppelia”, espetáculo dos alunos da Escola Municipal de Ballet Roosevelt Pimenta, e segue até domingo, sempre às 17h, no TAM: a história de uma boneca que provoca amores num marido e ciúmes na esposa.
O tema vem bem a calhar no Arraial de Palumbo, onde, à boca pequena, se comenta sobre produtos infláveis na bagagem de lulus.
FÁBULAS NA ESCOLA
Abner Barros, Ana Célia Silva, Arlysandro Câmara, Djalma Neto, Eduardo Evangelista, Jéssica Nascimento, Marcos Vinícios Silva, Marina Silva, Rayane Honório e Raysla Silva escreveram, e os Clowns de Shakespeare encenaram as 10 fábulas que serão lançadas, hoje, em livro. Na livraria do Midway, 17h.
CIFRÃO
Continua no Solar Bela Vista a exposição “A história da moeda no Brasil” – em tempos de crise, um bom lugar pra ver dinheiro. De segunda a sexta, 8h às 18h.
SOULMAN
Num dia 11 como este, em Los Angeles, USA, o cantor de soul Sam Cooke estava lá num bem-bom num quartinho de motel. Não se sabe o motivo, mas sua companheira escapole pelo corredor, e o jovem e excitado Sam, atrás. Para azar do soulman, uma certa Bertha Franklin, funcionária do motel, estava no corredor – armada. Ao ver o negro correndo em sua direção vestindo apenas as ditas “roupas de baixo”, não contou conversa: Sam Cooke morreu aos 33 anos debaixo de bala.
SOULMAN II
Sam Cooke ainda teve tempo de dizer: “Lady, you shot me”.
Um gentleman, sem dúvida.



PROSA
“Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca.”
Machado de Assis
Dom Casmurro
VERSO
“As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental.”
Vinícius de Moraes
“Receita de mulher”

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Juan Antonio Maria Elena Barcelona

O sobrescrito não é nenhum woodyallenmaníaco, mas “Vicky Cristina Barcelona” é o menos autoral dos filmes do diretor nova-iorquino – e aqui, talvez, esteja a explicação: filmado na Espanha, entre Barcelona e Oviedo, fica difícil a identificação com um dos temas preferidos do diretor, qual seja a relação umbilical dos habitantes com sua cidade natal (umbilical e neurótica, claro).
Besteira, me dirão os cinéfilos e connaisseurs: Allen vem filmando fora da América para baratear os custos de produção e viabilizar o que sabe fazer melhor. Já tinha partido pra Londres, quando de “Match point” (2005), que trazia a loiraça Scarlett Johansson, uma das protagonistas de “Vicky Cristina Barcelona”.
Johansson é Cristina, Rebecca Hall é Vicky, e Barcelona é Barcelona – mas falta o principal molho do filme em seu título: Maria Elena, encarnada por uma Penélope Cruz com ares de Amy Winehouse, e que dá um banho de interpretação nas duas americanas (Hall, na verdade, é inglesa – as personagens é que são americanas).
A historinha é banal: duas amigas viajam para Barcelona, uma para estudar a cultura catalã, a outra pra nada fazer, a não ser buscar sua própria identidade “artística”. Logo conhecem Juan Antonio, estereótipo do latin lover no imaginário da mulher americana parida em Hollywood – e que Javier Bardem se esforça para emprestar algo a mais que o roteiro frouxo não conseguiria se o ator fosse outro.
Instala-se então o previsível triângulo amoroso, explicitado e proposto pelo sangue quente do espanhol, mas não aceito pela americana mais racional, a noivinha Vicky.
A reentrada de Maria Elena, ex de Juan Antonio, restaura o vértice amoroso, entre idas e vindas na história e nos relacionamentos (isso, sim, típico de Allen), mas fracamente costuradas pela visão de cartão-postal do país estrangeiro.
Allen parece meio perdido na direção, citando visualmente os lugares-comuns Gaudí, Miró, e a imagem de poetas camponeses reclusos em casinhas de sonho (o que aproxima o diretor perigosamente da água-com-açúcar de filmes como “Sob o sol da Toscana”, recentemente, e “Uma janela para o amor”, em décadas passadas).
Tão perdido quanto as turistas americanas, inseguras em se entregar às paixões solares que a cultura mediterrânea parece inspirar eternamente entre os súditos do império americano, Allen coloca muito pouco de si no filme – a exceção de alguns diálogos iniciais entre Vicky e Cristina.
No final, literalmente, quem se dá bem são os personagens hispânicos e seus atores – Bardem, seguro de si e recuperado da peruca-canastrona de “Onde os fracos não têm vez”; e Penélope Cruz, que dá a impressão de estar sempre improvisando e melhorando o roteiro com seus cacos.
Pra concluir, esquecendo a assinatura em letras ilegíveis de Woody Allen, vale a pena assistir.
*
COICE
“Há exatamente um ano atrás, uma secretaria de uma grande empresa do RN com forte presença nacional, ligou para mim, pedindo o show de Khrystal para sua festa de congraçamento, e expliquei à mulher que Khrystal faria o show dela como tem feito pelo Brasil. Ela perguntou se não dava para Khrystal fazer uma hora de axé. Eu, educado igual a um coice de jumento, disse a ela que ligasse para Ivete, Claudia Leitte ou Bel, que elescantariam axé a noite toda. Ela desligou o telefone e acho que desistiu.” – Zé Dias, produtor cultural, marido e devoto de, adivinhem, Khrystal, em email festejando o sucesso da cantora e de Isaque Galvão na festa de encerramento dos trabalhos da OAB, em Brasília, segunda passada.
BOA MORTE
“É com pesar que a família Carlos Maia, comunica o falecimento da matriarca Fausta Carlos Maia – mãe Fausta – 108 anos, como carinhosamente era conhecida.” – Nelly Carlos Maia, em email divulgado ontem, mesmo dia do sepultamento, no cemitério público de Almino Afonso.
E completa: “Mãe Fausta nasceu no dia 19 de dezembro de 1899 e no próximo dia 19 completaria 109 anos. Era uma das mulheres mais velhas do estado. Teve oito filhos (quatro vivos), centenas de netos e dezenas de bisnetos e tataranetos, que se reuniam anualmente em sua Fazenda Oriente, para comemorar mais um ano de vida da matriarca. Filhos, netos, bisnetos e tataranetos estão consternados com a notícia, mas tranqüilos, pois ela faleceu em casa, em paz, na fazenda onde morou praticamente a vida inteira, no final da tarde desta segunda-feira.”
DONTCRAIFORMI
Sem dúvida, a presença de tantos nativos representando o Arraial de Palumbo no show bonaerense de Madonna, terminou ofuscando o brilho do Carnatal: foram as celebridades que faltaram à festa.
Bom, bom: só assim sabemos que temos um embaixador pau-ferrense na pátria do Tango (o maitre do restaurante Cabaña Las Lila – esse sim uma celebridade).
BOLLYWOOD
Hoje tem “The terrorist” aos pés da estátua de Augusto Severo, praça homônima, ribeyras do Putigy, 19h. Entre as boas recomendações, o fato de ser “o primeiro filme indiano a ser exibido no Sundance Film Festival”.



PROSA
“Mulheres amam acordar pra olhar que horas são, deve ser um convênio com Greenwich.”
Alex Nascimento
A última estação
VERSO
“Leu em restaurante de Madri:
‘Hemingway nunca comeu aqui’?”
Luís Carlos Guimarães
“Adivinhas”

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Vida inteligente após o Carnatal: prêmios, livros, mostras, debates e homenagens

HANGAR
Disputa dura será a escolha, hoje à noite, do Melhor Instrumentista segundo o Prêmio Hangar – concorrem oito nomes, todos de peso: Antônio de Pádua (pandeiro, cavaquinho e trompete), Di Stéffano (bateria), Dudu Taufic (piano), Gilberto Cabral (trombone), Samir Tarik (percussão), Sérgio Groove (baixo), e Manoca Barreto e Ricardo Baia (estes dois últimos, violão e guitarra).
Outras categorias também serão premiadas.
HANGAR II
O homenageado especial da 8ª edição será o músico Romildo Soares, que terá – neste, que é considerado um Seis & Meia Especial – suas composições interpretadas por 12 artistas (ditos “locais”).
Os cariocas do Situkerê encerram a noite de premiação com o show “Sai samba de Cartola”.
Tudo sai por R$ 10, inteira, R$ 5, meia – claro. No TAM, claro.
BRANCO
O dentista Henrique Gondim lança, hoje, 19h, na livraria do Midway, “Cavalo alado – uma senha para a liberdade”, segundo romance do autor, que, na esperança de ver brotar “novos talentos da literatura potiguar”, deixou as três últimas páginas em branco.
QUADRINHOS
Milena Azevedo, que precisou fechar sua Garagem Hermética Quadrinhos, avisa que está de plantão durante a exposição “A arte seqüencial no traço dos artistas do RN” para atender aos clientes.
A exposição começou ontem e continua até o próximo 21, no Espaço Agência Cultural Sebrae, alameda de Serviços do Natal Shopping Center, no horário normal do shopping, 10h às 22h. Já Dona Milena comparece em várias horas, dependendo do dia, mas, sempre, no horário das 20h às 22h.
VESTIBULAR
Já abertas as inscrições para a os cursos de Administração, Marketing, Ciências Contábeis, Turismo Bilíngüe, Hotelaria, Rede de Computadores e Análise e Desenvolvimento de Sistemas, da Faculdade Câmara Cascudo, que realiza vestibular próximo sábado, 13. Informações: 3198.1600 ou www.fcamaracascudo.com.br.
BOMBAIM É AQUI
Hoje, 19h, dentro da Mostra Internacional Bollywood (Goiamum), será exibido o filme “Bombay”, de Mani Ratnam, safra 1995.
O enredo é shakespeariano: um hindu se apaixona por uma muçulmana, casam-se, contra a vontade das famílias etc. O release diz que é um filme “bastante polêmico”, e que o diretor “teve a casa queimada após o lançamento”.
No Largo da Praça Augusto Severo (antiga rodoviária, Ribeira), mesmo local do Ene.
(Aliás, ninguém comentou um problemão do local e dos eventos realizados ali: durante o Ene o que tinha de carro estacionado irregularmente não era brincadeira. Os amarelinhos fizeram vista grossa.)
MESAS
Já pela manhã e à tarde, no auditório do SESC, rolam mesas – redondas, quadradas ou ovais, pouco importa: das 8h30 às 12h30, Cila Gabel, Geraldo Cavalcanti e Josenilton Tavares discutem as leis de incentivo à cultura. Já Gianfranco Marchi e João Baptista Pimentel trocam figurinhas sobre direitos autorais, das 14h às 18h.
ELOGIO
“Naquele tempo as revistas Fon-fon, Malho, Careta, já estampavam caricaturas do Erasmo, uma grande esperança. Infelizmente, morreu cedo, um gênio da pintura precocemente apagou-se, um astro que brilhava com grande intensidade. Parece que os gênios morrem cedo.” – de Dona Nati Cortez, no livro inédito encontrado recentemente pelo seu filho, Luiz Gonzaga. O Erasmo citado, “gênio”, astro a brilhar com grande intensidade, era Erasmo Xavier, que já foi biografado por Rejane Cardoso.
DELÍRIO
“Erasmo Xavier, o elogio do delírio”, a biografia do tio de Rejane, publicada em fins dos anos 80 , exige, há muito, uma reedição.
O designer Afonso Martins, responsável pela primeira edição, já se comprometeu em rever o projeto gráfico, quase sua estréia na arte que o consagrou – exceção à regra, aliás, que se auto-impôs: há tempos, Martins evita assumir empreitadas do gênero, mais dedicado que está ao trabalho autoral.
CASCUDIANA
Outras exceções martinsianas foram as capas dos 15 livros que a UFRN lançou recentemente no seu cinqüentenário.
Aliás, os quatro livros de Cascudo (“O tempo e eu”, “Nosso amigo Castriciano”, “Vida breve de Auta de Souza” e “Vida de Pedro Velho”), mais a “Viagem ao universo de Luís da Câmara Cascudo”, de Américo de Oliveira Costa, terão novo lançamento, hoje, 19h, no Museu Câmara Cascudo, durante a abertura da exposição “Ler/sonhar: signos da busca da brasilidade no encontro Mário de Andrade-Câmara Cascudo”.
As fotografias das cinco capas são de Max Pereira.
Cinco boas sugestões, enfim, para quem quer bancar um Papai Noel, digamos, mais papa-jerimum.
SAUDADE
Voltando à Dona Nati Cortez, seu filho corrige a própria informação repassada, aqui, ontem, sobre o título dos originais: “Nati e o Natal do seu tempo de menina – Jornal da Saudade” é o verdadeiro título. E informa a data da escritura: entre o 8 de dezembro de 1957 e o 10 de setembro de 1964, mas com o ponto final aposto somente em 1967.
O TEMPO E EU
Vergonha, vergonha, vergonha: no Prosa de sábado passado, engoli o “g” de “fisiológicas”. A frase completa era: “A nossa Memória deveria ter limites, como outras funções fisiológicas.”
Frase do mestre Câmara Cascudo, claro. O que aumenta o rubor nas minhas fauces.



PROSA
“A raposa prega a coexistência pacífica nos galinheiros.”
Câmara Cascudo
O tempo e eu
VERSO
“Teu corpo é um róseo vinho alucinante
De febre enchendo os corações partidos”
Henrique Castriciano
“Amor pagão”

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Três e-mails

Nesta temporada de carnatal – que obriga, a quem fugir não pode do Corredor da Alegria, a permanência na própria residência pelo temor aos congestionamentos, do trânsito e do silêncio – recebo três e-mails que me tranqüilizam a alma, tão combalida e carente de confete e serpentina, pierrô e columbina.
O primeiro, de uma leitora, S. M. as iniciais. Diz que lê esta coluna todos os dias – e acrescenta, à guisa de arremate final: “adoro”.
Mais: que amou a de sexta passada, “porque toda quinta-feira estou no Nordestão da Roberto Freire”. E conclui: “Obrigada pela parte que me toca”.
O segundo é de uma velha-conhecida-nova, G. L. (as iniciais são pelo pudor alheio). O motivo, a mesma crônica citada por S. M., que em G. L. produziu “gargalhadas”. E revela assunto intimamente familiar: “Continuo lendo você, mesmo que para isso tenha que almoçar, aos sábados, na casa da minha mãe, ou tomar um expresso, no café da Seridó”.
Ora, ora, se esta coluna está proporcionando encontros filiais quem haverá de questionar sua utilidade pública? Ademais, que ninguém ouse revelar à excelentíssima genitora de G. L. que a visita da filha iluminando as manhãs dos sábados tem outros motivos e intenções que não apenas preencher as cavidades do coração materno.
Da minha parte, auguro que a senhora ofereça à filha uma xícara de chá, ou café, uns biscoitos de polvilho, um bolo de laranja, para acompanhar a leitura deste sobrescrito. E que, em silêncio, observando a filhar ler o jornal, lhe faça um afago nos cabelos, porque para isso as mulheres se tornam mães, e para isso nascem as filhas: para se olharem com carinho e respeito, para medirem na juventude de uma, e na velhice da outra, o passar do tempo e sua arquitetura, às vezes impiedosa, mas quase sempre de uma beleza invulgar.
É de G. M. uma frase, lamento, poema, também de uma beleza rara: “Quisera escrever poemas, talvez não fosse triste...”
Longe da tristeza, felicidade é o que me trouxe o terceiro e-mail, de Luiz Gonzaga Cortez, jornalista de fina estirpe, amizade que se constrói pouco a pouco, à distância, mas com admiração recíproca. Felicidade porque fala de livros, fala de mães, de pais, do Dr. Antônio José de Melo e Souza, pseudônimo de Polycarpo Feitosa, e fala de uma Natal antiga, todos objetos de devoção deste sobrescrito, a cada dia mais velho, a cada dia mais ranzinza, como convém à estereotipia que se faz dos mais idosos, ou os de meia-idade, como eu.
Segue um resumo deste terceiro bilhete eletrônico:
“Meu caro Mário Ivo, Laélio Menezes de Melo não foi o único a encontrar os originais de um livro importante, no caso dele, ‘A canção da montanha’, de Othoniel Menezes, seu pai. Também eu achei os originais de um livro que se considerava perdido, nunca tendo sido publicado: ‘Natal do meu tempo de menina’, o título que a minha mãe, Maria Natividade Cortez Gomes (1914-1990), deu a um dos seus livros. Encontrei os originais, manuscritos, dentro de uma caixa cheia de livros, no meio de dois volumes da ‘Divina comédia’. Para mim, foi um achado de valor, pois conhecia apenas umas dez folhas datilografadas. Quando a minha mãe era criança, Natal era uma cidadezinha pequena e pacata. Ela foi criada na Ribeira, na rua do Triunfo, hoje 15 de novembro, nos tempos em que o bairro era um misto de bairro comercial e residencial. Considerei interessante o trecho que se segue:
‘Certa ocasião, havia uma festa no Teatro Carlos Gomes. Tratava-se de uma festa cívica na qual o governador Dr. Antônio de Souza estava presente. Então a Lilita chamou-me para irmos à dita festa, às escondidas dos nossos familiares. Ao chegarmos no teatro, este estava inteiramente lotado. Pois não é que resolvemos ir para o camarote do governador? Ficamos aboletadas e assistindo a festa sob os olhares atônitos do governador. O Dr. Antônio de Souza, com aqueles óculos, não cessava de nos mirar, mas não mandou nos enxotar. Assim, assistimos de camarote a festa cívica daquele ano.’
Vou tentar publicar o livro em 2009. Por hoje é só. Um abraço. Luiz Gonzaga Cortez.”
Perceberam no texto de Dona Nati Cortez similaridades com os dias que correm? As famílias iam ao Teatro, o governador dispunha de camarote, a festa era dita cívica.
Tudo muito parecido com o Carnatal.
Mas, chega! Isso é outra história. Lá vem este chato novamente, sem nem mesmo preocupar-se em meter umas galochas para ficar mais a caráter. Falava eu de e-mails e de leitores, falava eu da alegria que S. M. me proporcionou, porque se identificou com uma daquelas mulheres do Nordestão da Roberto Freire.
Falava eu, pintando com tintas edulcoradas o encontro aos sábados de mãe e filha – que, enfim, espero não tenha sido afetado pelas agruras do... argh... Carnatal.



PROSA
“O carnaval é uma amostra, na terra, de como será o inferno no céu.”
Júlio Camargo
A arte de sofismar
VERSO
“eu e o meu hábito
de ser feliz”
Diva Cunha
“eu e o meu hábito”

sábado, 6 de dezembro de 2008

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Isabel Vieira

Lá pras tantas Isabel Vieira se auto-denuncia como uma das muitas “forasteiras” que nos invadiram a praia, nos últimos anos. Jornalista, autora de livros juvenis, essa paulista, diria eu, é uma das que não incomodam, pelo contrário – basta conferir seu interesse pelo Ryo Grande e em especial pela sua Capital. Interesse, como vocês verão, que vai muito além da água-de-coco. Para saber mais sobre a escritora dêem uma espiada em seu sítio: www.isabelvieira.com.br.
MOVIDA A ÁGUA-DE-COCO
A primeira coisa que me encantou em Natal foi a luz. A claridade, a luminosidade, o céu azul. Eu, que antes só enxergava da janela uma nesga de nuvens cinza entre um mar de prédios – e aviões chegando e saindo de Congonhas, sem trégua –, me vi numa cidade de amplos espaços abertos, o céu azul-anil, à tardinha azul-cobalto, à noite todo estrelado, a lua surgindo atrás das dunas, pura prata, esbanjando luz.
Depois foram as cores, cheiros, sabores. Graviola, caju, melão, mangaba, abacaxi transparente de tão doce, mangueiras carregadas, buganvílias subindo pelos muros, perfume de jasmim. Um tapete cor de maravilha cobre a calçada da casa de Lídice... O que é isto?, pergunto, fascinada. Flores de jambo que caem das árvores, me explicam. Eu não sabia que a “morena cor de jambo” era dessa cor.
Charles me mostra a tábua de marés, e a turista apressada, nascida em Santos, tantos verões em Ilhabela e Guarujá, vai descobrindo os ritmos da natureza, o vai-e-vem das ondas, as fases da lua, os pores de sol. Érida me ensina que as dunas filtram a água do mar e a transformam em lagoas; que tarefa delicada! Natal é uma cidade onde se pode observar a natureza da janela de casa.
Ok, agora todos já sabem. Faço parte da leva de paulistas que chegou a Natal nos últimos anos para morar. Vocês devem estar cansados de ver tanto forasteiro invadindo sua praia, tanto prédio subindo, tanto carro engarrafando o trânsito, tantos sotaques pelas ruas: carioca, gaúcho, mineiro, paranaense, catarinense; sem falar nos estrangeiros... Mas vocês têm certa culpa pela invasão. Quem mandou tratar tão bem os visitantes?
É um lugar onde, desde o primeiro dia, me senti em casa. Marcelo e Patrícia abrem as portas de Pirangi. Ângela apresenta o Parque das Dunas e o pôr-do-sol no rio Potengi. Roberto fala sobre Cascudo e os escritores da terra. Emanoel e Edilena nos acolhem na pracinha do Alecrim, que parece cenário de novela. Cafés, almoços, conversa boa, casas de praia...
Desacostumada a essas gentilezas, temo ter sido indelicada com alguns – desculpem! --, até por falta de treino, pois venho de uma selva onde não se costuma visitar ninguém sem avisar nem partilhar uma refeição não planejada. Nos percalços da metrópole, é comum ficar meses ou até anos sem ver os amigos -- não estou exagerando, podem acreditar.
Este cenário físico e humano me tomou de tal forma que, quando vi, já o havia trazido para A Balada da Lua Azul (ed. Salesiana, 2007), o primeiro livro que escrevi em terras potiguares, para leitores jovens. Os personagens se movem ora em lugares reais, batizados com nomes fictícios, ora em locais fictícios situados em pontos geográficos reais – quem os conhece saberá distingui-los na ensolarada Natal.
No meu processo criativo, o cotidiano interfere de forma inesperada: às vezes, algo que ouvi na véspera surge da fala de um personagem; outras, o clima da cidade se impõe, exigindo mudanças na trama já estruturada. Assim foi com os livros anteriores, gestados na agitação de Sampa e no frio de Campos de Jordão. Assim foi com a Balada...
Até porque, nos caminhos para escrevê-la, encontrei pessoas que mais me foram enlaçando à terra. As jovens enfermeiras que me confiaram suas experiências se fundiram numa personagem. As lições de Bioética da professora Raimundinha se impregnaram na trama, passada entre o hospital e a praia. No sebo de Vera e Jácio resgatei a trajetória de uma figura que viria a merecer um capítulo à parte: o doutor Januário Cicco, um homem à frente do seu tempo, um visionário.
Dá pra imaginá-lo sobre as dunas, sob o sol ardente, vistoriando a reforma que transformou a casa de praia do governador Alberto Maranhão num hospital de dezoito leitos, o atual Onofre Lopes – isso em 1909, quando Natal era um lugarejo insalubre, habitado por dez mil almas? Na época, Januário já pensava em saneamento básico. Foi o primeiro médico da América Latina a escrever sobre um tema polêmico e maldito: a eutanásia. Aqui está seu livro, pouco conhecido Brasil afora: Euthanasia-- novella scientifica, editado pela Fundação José Augusto, numa reprodução fac-símile da original, de 1937, da editora carioca Irmãos Pongetti.
Há muito mais a falar sobre Januário Cicco, figura que me cativa, como outras desta terra: Nísia Floresta, Auta de Souza, Cascudo, o aviador francês Mermoz... É questão de tempo me debruçar sobre elas. Já troquei o cafezinho pela água de coco e acostumei o ouvido aos nomes sonoros que me conquistaram: Capim Macio, Alecrim, Camurupim, Pium... À sombra dos cajueiros, sigo buscando conhecer melhor suas vidas. O que não falta em Natal são boas histórias para contar. [Isabel Vieira]



PROSA
“A nossa Memória deveria ter limites, como outras funções fisiolóicas.”
Câmara Cascudo
O tempo e eu
VERSO
“Lar é de onde se vem.”
T. S. Eliot
“East Coker”