terça-feira, 2 de dezembro de 2008

O panorama visto da balaustrada

Ontem falei do Belvedere da Avenida Atlântica, atual Getúlio Vargas. Acho que fui um tanto quanto divagante, exageradamente poético: eu deveria ter soltado os cachorros em cima dos administradores deste Arraial de Palumbo.
Ter dito claramente aos leitores que é um absurdo que o único mirante urbano desta Capital esteja com o mato pelas canelas. Literalmente às moscas, imundo. E muito pouco seguro.
Será que ficou claro, também, que o local funciona como um abrigo para animais? A iniciativa, aliás, é louvável. Imagino que a pessoa que mantém três cães e vários gatos num pedaço de terra à beira do precipício seja uma pessoa com um bom coração e as melhores intenções. Mas com certeza não é o local adequado.
Imagino, também, que todos os moradores dos prédios no alto de Petrópolis já conheçam a situação do belvedere há tempos. De vista. Afinal, a têm privilegiadíssima. Mas, como provavelmente têm medo de sair pela portaria e prefiram o portão da garagem, o carro com película, quiçá blindado, dali para a segurança do shopping ou dos restaurantes “in”, também eles dão de ombros enquanto aguardam pelo footing no Central Park ou no Jardim das Tulherias. Nada como atravessar o Atlântico ou cruzar o quintal dos EUA para exercermos nossa cidadania.
E, se ontem, eu citei Polycarpo Feitosa, hoje vou de um outro autor, contemporâneo do ex-governador: “Gizinha”, citação de ontem, é de 1930; pois, dois anos antes, Mário de Andrade visitava Natal. Tinha embarcado no “Manaus” em 3 de dezembro (amanhã, 80 anos), aportado em Recife sete dias depois, e embarcado novamente dia 13, desta feita num trem da Great Western of Brasil Railway Company Limited.
DÓ-DE-PEITO
Chegou dia 14 e dia 16 já escrevia:
“No bairro alto de Petrópolis a avenida Atlântica se acaba no dó-de-peito dum belveder e mostra lá embaixo, Areia Preta, uma das praias mais encantadoras que conheço. E, se o rumo foi outro, chegamos ao Tirol, altura onde moro hospedado pela ventania. Eh! ventos, ventos de Natal, me atravessando como se eu fosse um véu. Sou véu. Não atravanco a paisagem, não tenho obrigação de ver coisas exóticas... Estou vivendo a vida de meu país...”
A descrição, claro, está no mais que famoso “O turista aprendiz”.
Dá pra fazer uma antologia de autores que citaram o hoje esquecido mirante (é óbvio que não é o mesmo, a avenida foi duplicada etc, e tampouco é a mesma paisagem, agora temos a ponte etc. – mas o “visual”, como se dizia uma época, continua de tirar o fôlego).
Coincidentemente, no Ene foi lançado um belo livro (“Além do nome”, Coleção Letras Natalenses), sobre o qual falaremos com mais calma em outra ocasião. Por enquanto, pego emprestado da entrevista que Marize Castro fez a Franco Jasiello algumas palavras do italiano migrado a Natal:
“Dá-me sempre a impressão, quando passo pela Getúlio Vargas, que nós somos como os maridos das mulheres bonitas, só os outros se encantam, eles se esqueceram que estão casados com uma mulher bonita. Natal é um sonho de beleza!”
Pra convencer a mamma italiana a deixar São Paulo e mudar pra Natal, Jasiello a levou pra Ponta Negra – “Parece Capri!”, exclamou a senhora. O golpe fatal, na balaustrada: “Os olhos dela se encheram de lágrimas com a beleza do panorama”, contou o poeta à Marize Castro.
Que lindo.
Que feio.
*
CREUZA
Hoje tem Maria Creuza no Seis & Meia, TAM. A atração local fica por conta de Nelson Freire, ex-deputado e com CD novo na praça, “Essências”, ao qual devem seguir-se mais quatro, dois deles em parceria com Diógenes da Cunha Lima e Paulo Davim.
Durante os shows, serão anunciados os indicados para o Prêmio Hangar.
ACARI MON AMOUR
É hoje que a atriz acariense Rejane Medeiros recebe homenagem especial do Goiamum Audiovisual: uma peça de Guaraci Gabriel.
Durante o coquetel de lançamento do festival mais agitado da paróquia, Alamanda Mall, Petrópolis, 20h.
RETRO
No mesmo local será montada uma sala com fotos, cartazes e objetos da atriz, e exibidos “Meu nome é Lampião” (1969) e “Soledade (1976) – respectivamente quarta e quinta, sempre às 19h.
(O Goiamum é excepcional – mas, chamar de retrospectiva uma mostra com apenas dois filmes, sei não.)
VIOLA MINHA VIOLA
Programado para os próximos dias 10, 11 e 12, o IV Festival Internacional de Trovadores e Repentistas levará para Limoeiro do Norte, Ceará, entre outros, o nosso presidente da Fundação Zé Augusto, Crispiniano Neto. Que divide mesa com a professora Simone Oliveira sobre o tema “‘Desafios’ no tempo e no espaço: a cantoria de viola no século XXI”.
MESA
Crispiniano também estará noutra mesa, no dia anterior e dessa vez mais perto de casa: discutirá com a turma do Goiamum, mais Dácio Galvão e outros, o tema “Auto-sustentabilidade: parcerias institucionais e formação de redes locais”.

Comentário ouvido nas saídas e entradas da tenda climatizada do Ene: Zé Miguel Wisnik salvou o Encontro.
É uma opinião.



PROSA
“O vento de Natal é mano dele.”
Mário de Andrade
O turista aprendiz
VERSO
“Os machos, tu dizias, têm até nos vermes.”
Franco Jasiello
“Correspondência atrasada”

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