terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Sonhos que o dinheiro não pode comprar

Uma coisa puxa a outra e domingo desses dou de cara com Rock Hudson e Lauren Bacall num filme mediano, “Written on the wind” (no Brasil, “Palavras ao vento”). Safra 1956.
Hudson é Mitch, Lauren é Lucy. Entre os dois rola uma atração. Tudo bem, se Lucy não estivesse naquela condição que o Rei Roberto Carlos resumiria numa questão quase insolúvel e dramática: “Pois comigo aconteceu/ eu gostar da namorada de um amigo meu”.
A terceira perna do triângulo era Kyle, interpretado por Robert Stack. Um playboyzinho herdeiro de um magnata do petróleo, um sujeito triste. Triste e amargo. E alcoólatra. Uma bela combinação que, adicionada a uma mulher com o rosto de Lauren Bacall, claro que só pode dar em merda – com o perdão da palavra, mas outra não há para melhor definir o entrevero.
Mesmo não acontecendo nada entre o melhor amigo e a esposa, o maridão sente-se enganado etc. Quando ela lhe diz que está grávida ele nem mesmo espera pela dúvida eterna, já descrita por Machado através de Bentinho e Capitu e Escobar.
Kyle aplica uns safanões em Lucy, o bastante para lhe provocar um aborto. Mitch toma suas dores, uma discussão, uma arma de fogo, um acidente, e Kyle morre. Entre idas e vinda, o final é feliz. Ao menos na versão cinematográfica.
Descobri que a história teve inspiração na realidade. E envolve uma mulher com uma dessas vidas mais que dramáticas. Libby Holman era uma atriz da Broadway sem meias-tintas, meias-caras, meias-bocas: além de homens, teve muitas amantes mulheres, entre elas a herdeira da DuPont, Louisa d’Andelot Carpenter. Em 1931, aos 27 anos, casa-se com um herdeiro, não de poços de petróleo, mas de folhas de tabaco – Smith Reynolds, da R. J. Reynolds (Camel, Kool, Winston, Salem, Pall Mall). Uns sete anos mais novo, o que, na época, era já um escândalo em si.
Smith não tava nem aí pros negócios da família – e não queria que a esposa voltasse aos palcos. Passam um ano na casa da família Reynolds, escandalizando a todos com suas festas e amizades. Até que um tiro mal explicado lhe tolhe a vida. Libby Holman foi indiciada, junto com o suposto amante, por assassinato. A família Reynolds consegue abafar o caso e muda a causa da morte para suicídio.
Ao contrário do filme, Libby Holman tem o filho, que morre antes de completar 20 anos, escalando uma montanha. Adota outros dois, casa-se outras duas vezes, o segundo marido se suicida, vive anos junto com Louisa d’Andelot, e nos anos 40 tem uma relação com a escritora Jane Auer Bowles, que era esposa do também escritor Paul Bowles (confira uma visão caricata da relação dos Bowles em “O céu que nos protege”, de Bertolucci).
Em 1971, Libby fecha a garagem de sua mansão, liga o motor do seu Rolls-Royce e se deixa morrer.
O motor de um Rolls-Royce, dizem, é o som mecânico que mais se aproxima do silêncio.
*
SURREALISMO
“Dreams that money can buy” é o único filme onde Libby atua. Dirigido por Hans Richter, em 1947, é um filme experimental sobre um sujeito que ganha a vida contando, em troca de dinheiro, seus sonhos. Os cenários, criados num loft de Manhattan, ficaram por conta de nomes como Man Ray, Max Ernst e Marcel Duchamp.
O VIAJANTE
Paul Bowles (1910-1999) é um dos escritores preferidos do sobrescrito. Viveu cerca de meio século em Tânger, no Marrocos, tema de muitos dos seus contos (traduções brasileiras de sua obra são, infelizmente, difíceis de achar), e onde recebeu amigos-escritores como Tennessee Williams, Truman Capote, Gore Vidal, e os beats William Burroughs, Allen Ginsberg e Gregory Corso.
Com Tennessee Williams escreveu alguns diálogos para “Senso”, filme de Luchino Visconti, e, compositor prolífico, também escreveu a música de “Dreams that money can buy”.
AVE MARIZE
“Não aceito alguns movimentos retrógrados e reacionários que transformaram essa figura forte na mulher passivamente submissa de uma religiosidade alienante ou na tola doce mãezinha dos céus” – Marize Castro, autora do texto do Auto de Natal deste ano, sobre Maria, mãe de Jesus.
No lado feminino do espetáculo tem ainda as cantoras e compositoras Simona Talma e Valéria Oliveira, a figurinista Kátia Dantas, a fotógrafa Candinha Bezerra, e Ivonete Albano como assistente de produção.
REMEXO
Ainda não foi ontem que saiu o novo nome para a Funcart.
Com apenas sete secretários e uma secretária, Madagascar continua.
REMEXO II
É hoje que acontece mais uma eliminatória do 1º Festival da Canção e da Cultura Potiguar, realizado pela Assembléia Legislativa deste Ryo Grande – a última, antes da final, dia 19.
A partir das 18h, na Ilha de Santana, Caicó City.



PROSA
“Tudo, como se sabe, acontece inicialmente em outros países e só depois no nosso.”
Jorge Luis Borges
O informe de Brodie
VERSO
“Roubem o que lhes roubaram,
tomem finalmente o que lhes pertence”
Enzensberger
“O naufrágio do Titanic”

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