sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Uma noite no Catombo (e II)

Deixei meus leitores derna de ontem no banheiro do Bar de Pedrinho Catombo. Quero dizer, eu estava lá, não vocês. E, não, não pensem que foi a mijada mais longa da história – é que não cabia neste espaço tudo o que sucedeu naquela noite. Daí que continuo de onde parei, isso, no banheiro: onde eu pensava em como tudo aquilo lembrava a decrepitude exótica de Havana, Cuba. E que logo ali, quase que por trás daquelas paredes, estava o centro do poder municipal (e a pouquíssimos metros do Legislativo Estadual).
E eu fiquei pensando se um dia a neo-prefeita-eleita desceria do bolo-de-noiva-enfeitado que é o prédio da prefeitura e se arriscaria a uma cerveja no Bar de Pedro Catombo, seu vizinho. Ah, seria legal, sério, tenho certeza de que seria mui bem recebida, afinal, a moça é muito simpática às massas. Pensei tudo isso enquanto esvaziava a bexiga, que, claro, vazia ficou, e como batiam à porta espanei a poeira dos pensamentos e voltei para o asfalto da Rua São Tomé, quase esquina com a Ulisses Caldas.
Mas não por muito tempo: veio a chuva, num estrondo, como se fim do mundo fosse. E da chuva vieram, primeiro as biqueiras, grossas, fartas, cachoeiras do céu; depois, a enxurrada, arrastando sobre o asfalto um mundo de coisas, coisas do mundo. E as coisas do mundo eram líquidas e quem restou mudou-se para dentro do boteco.
Onde Isaque Galvão cantava. Não um choro, mas um samba. Ali, em meio aos tamboretes e mesas, o artista brilhava mais que num palco iluminado. Nunca vi um Isaque Galvão tão inspirado. Alguém se assombrou: “Parece até que ele tem um microfone na garganta!”
Verdade. A voz saía límpida, audível, emergia das ondas sonoras sem esforço, plainava sobre nós, como estrelas por trás das nuvens cor de chumbo. (Não preciso revelar quantas cervejas tomei, claro, mas o clima era por aí e pelo tom denunciado que dispensa o bafômetro.) E eu ainda imaginei que ele incorporaria um Ed Motta e começaria a cantar “Do you have other love?” – mas aí seria querer demais.
No entra-e-sai, Dona Damiana, da Escola de Samba Balanço do Morro, lembrou da homenagem a Fernando Luiz, o autor de “Garotinha” e pai da garotona Fernanda Tavares, para a Festa da Carne deste ano. As meninas queriam saber se Murilo Rosa apareceria. Não, não. Não apareceu, ontem, na quadra da escola, Rocas. Como também ainda não apareceu dinheiro da prefeitura para o carnaval deste ano, me confidenciou Damiana, baiana-potyguar.
No entra-e-sai, surge Zé Dias – “só pra prestigiar, Zizinho”, faz questão de dizer, botando lenha no mote “eu só acredito em evento cultural assim: ou com muito dinheiro ou sem dinheiro algum”. O choro do Catombo, claro, na segunda hipótese.
No final, ainda deu pra fazer um périplo Bardallos-Cervantes-Bella Napoli.
Vez por outra a capital do Ryo Grande é uma festa.
*
CHOROS
Em seu “Panorama da música popular brasileira na ‘Belle Époque’”, Ary Vasconcelos vai contra a idéia comum levantada por muitos (entre eles José Ramos Tinhorão) de que o chorinho era filho da melancolia: “Quer-me parecer, antes, que a palavra ‘choro’ nesta acepção, deriva de ‘choromeleiros’, corporação de músicos, e que teve atuação importante no período colonial brasileiro.”
Mas cita também Cascudo (infinitas vezes), para o qual choro vinha de “xolo”, bailes de negros nas fazendas – “por confusão com a parônima portuguesa, passou a dizer-se ‘xôro’, e, chegando à cidade, foi grafada choro, com ch.”
LÁGRIMAS
Pois, de choro verdadeiro trata o filme criado pela Base Propaganda para a Liga Contra o Câncer. Procurem no YouTube ou na página www.nosfazemosevoce.com.br.
Mas enquanto mais de 3,5 mil pessoas já tinha assistido o vídeo no YouTube, o número de pessoas que fizeram sua doação na página da Liga não chegava nem a meia centena.
Insensibilidade, veraneio ou crise?
A turma dos parrachos bem que podia rodar a sacolinha, entre um 12 anos e outro.
MARROM
Mais uma oportunidade para assistir a “Coisa de preto” da brown Khrystal. Hoje, Praia Shopping, 20h30.
CINE
Estréia hoje “Hannah sobe as escadas”. No Moviecom, 15h45. E “Austrália”, com Nicole Kidman, nas duas cadeias da cidade, vários horários.
ALANIS
Quem não puder embarcar para Recife ou Fortaleza, pode entrar no clima Alanis Morissette por estas ribeyras mesmo: amanhã a banda Electra mais os DJs Alex Myself e Iran fazem festa na boate Edifício Club, Rua Frei Miguelinho, Ribeira.
FAB FOUR
Amanhã tem Beatles Abbey Road, banda cover adivinhe de quem – no Vila Hall, Hotel Vila do Mar, Via Costeira. Para mais informações, liguem 3646.3292.
Segundo o release, os músicos “utilizam a única coleção completa de instrumentos musicais e amplificadores existentes no mundo”, o que inclui as guitarras usadas por John Lennon e George Harrison, três contrabaixos usados por Paul McCartney, e algumas das baterias usadas por Ringo Starr.
BOLACHAS
O Radiohead lança em abril 12 singles. Em vinil.



PROSA
“Chove? Não: chora. Chora na cidade como chove em seu coração.”
Alan Pauls
História do pranto
VERSO
“nenhum som me importa
afora o som do teu nome que eu adoro.”
Maiakóvski
“Lílitchka!”

Nenhum comentário:

Postar um comentário